
Com a primavera, e sobretudo nos meses de abril e maio, existem mais alergénios no ar que podem espoletar reações alérgicas como rinite, conjuntivite e asma brônquica. Fique a conhecer como acontecem as alergias, assim como formas de prevenção e tratamento.
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A primavera traz geralmente muitas alterações ao nosso dia a dia. São os dias que ficam mais longos, a temperatura aumenta e toda a natureza desabrocha para uma novo ciclo de vida. Nós próprios somos convidados a ter mais atividades ao ar livre: os passeios a pé, os percursos nos parques e jardins nas cidades em que vivemos, são um convite à relação com a natureza. No entanto, a descrição maravilhosa do que é e constitui esta estação do ano pode ser para muitos doentes um enorme problema.
O que provoca as reações alérgicas?
As alergias primaveris são frequentemente causadas por pólen de árvores, gramíneas e ervas, flores e arbustos que florescem nesta estação. O pólen é transportado pelo vento e pode ser facilmente inalado, causando reações alérgicas em pessoas sensibilizadas.
Em todo o mundo são milhões as pessoas com sintomas oculares, nasais, respiratórios e outros que resultam de uma resposta alérgica do seu sistema imunológico à inalação de micropartículas destes pólens.
Apesar de serem estes os principais alergénios da primavera, não podemos ignorar alguns fungos que predominam nesta época do ano, muitas vezes difíceis de diagnosticar, e ainda as reações alérgicas graves, anafiláticas, potencialmente fatais em doentes alérgicos a picada de himenópteros (abelhas, vespas).
Principais formas de alergias na primavera
As condiçoes clínicas mais comuns são a rinite alérgica, ainda por muitos conhecida como febre dos fenos, a conjuntivite alérgica e, com menor expressão, a asma brônquica decorrente de alergia a pólens e, portanto, expressando-se por crises de asma que surgem sobretudo na primavera.
Se não diagnosticadas e tratadas, todas estas condições clínicas vão afetar a qualidade de vida dos doentes, as condições de aprendizagem das crianças e jovens e as capacidades de trabalho dos adultos. A interferência dos sintomas na capacidade de concentração, no sono reparador assim como nas atividades do dia a dia são por demais conhecidas.
Os sintomas oculares comuns são o prurido (comichão) ocular, o lacrimejo, a congestão (conjuntivite) ocular, que podem ser tão intensos de forma a dificultar a visão e induzir intolerância à luz do dia, preocupante e muitas vezes desafiante em termos de tratamento em crianças com esta sintomatologia mais grave.
Na rinite alérgica a pólens, os sintomas comuns incluem:
- Prurido (comichão) nasal, no palato, orofaringe e ouvidos
- Espirros frequentes
- Escorrência nasal (Rinorreia)
- Congestão nasal ( obstrução nasal)
- Olheiras
Em casos de asma associada, a falta de ar, a tosse seca e a pieira (gatinhos no peito) são os sintomas fundamentais e mais graves.
Porque há mais alergias na primavera?
Na primavera existe uma grande concentração de pólens no ar, porque muitas árvores e gramíneas florescem e libertam grandes quantidades dessas partículas. O pólen é transportado pelo ar, em correntes de ar quente, e maiores concentrações destes alergénios são, portanto, encontradas em dias mais quentes, nomeadamente ventosos ou a seguir a trovoadas.
A reação alérgica ocorre após inalação ou contacto (raros casos de conjuntivite alérgica isolada) em doentes sensibilizados, a um ou vários tipos de pólens. De realçar que, classicamente, os sintomas aparecem no exterior das habitações.
Dependendo do país e do local onde se vive, o início e fim dos sintomas vão também depender de outras variáveis, como as condições climáticas em cada primavera.
Assim, em primaveras mais frias e com chuva os sintomas são mais ligeiros, enquanto que em primaveras mais quentes e/ou ventosas os sintomas são mais graves, incomodativos e influenciadores do estado do doente.
Os principais alergénios e quando estão mais ativos
Em Portugal, a época polínica começa tradicionalmente em março, estando em crescendo, com picos polínicos típicos, em abril e maio. Os alergénios mais comuns são polens de árvores: Oliveira, Azinheira, Carvalho, Plátano, Pinheiro, Bétula, Cipreste, Acácias, que tendem a libertar mais pólen no início da estação.
As gramíneas selvagens e cultivadas: pólen de gramíneas e ervas como: Urtiga, Quenopódio, Parietária, Artemísia, Plantago, tem picos mais notórios em abril e maio enquanto a ambrósia é em junho. Sintomas típicos da primavera podem ocorrer em setembro e em outubro, sendo aqui um dos alergénios mais comuns é o da parietária (politária).
Atualmente, na maioria dos casos, é possível atingir-se um excelente controlo da doença alérgica, com obtenção de uma boa qualidade de vida.
Quais as causas das alergias sazonais?
A prevalência das alergias sazonais tem aumentado nos últimos anos, podendo este facto ser atribuído a vários fatores, incluindo as alterações climáticas, a poluição atmosférica industrial, recurso a combustíveis fósseis e vários outros. Para quem vive em áreas urbanas como Lisboa e Porto, a combinação de poluição e pólen pode ser especialmente problemática. As cidades tendem a ter mais poluentes que, interagindo com os pólens, aumentam a sua capacidade de provocar reações alérgicas e mesmo potenciar a sua gravidade.
É importante que um doente alérgico fique atento aos níveis de pólen e à qualidade do ar, especialmente em dias quentes, secos e com vento, que é quando a dispersão de pólen é maior.
Em Portugal, os nossos doentes alérgicos podem obter informação de níveis polínicos através dos dados do IPMA (Instituto Português do Mar e Atmosfera).
A Sociedade Portuguesa de Alergologia e Imunologia Clínica, fornece informações semanais para a comunicação social, sobre as previsões de níveis polínicos e a sua distribuição nas diferentes áreas do país. Podem ser consultadas informações sobre níveis polínicos em www.spaic.pt ou www.rpaerobiologia.com. São importantes no sentido de ajudar os doentes a utilizarem estratégias para minorar os seus sintomas.
Importância do diagnóstico especializado
Para o diagnóstico correto, a primeira atitude a tomar será consultar um especialista em imunoalergologia. O diagnóstico da causa da alergia é fundamental para a orientação terapêutica e estabelecer estratégias para reduzir as queixas dos doentes.
O diagnóstico é baseado na história clínica, ou seja, na existência de uma relação entre sintomas e fatores que o doente possa identificar ou suspeitar como desencadeadores dos sintomas. Este aspeto de relacionar sintoma com fator desencadeante pode muitas vezes ser enganador se não se fizerem as perguntas certas. Assim, podemos ter um doente que, por exemplo, trabalha num escritório e que, não tendo sintomas no local de trabalho, após o termo do mesmo desloca-se ao fim da tarde a pé para casa numa distância pequena, atravessa um pequeno jardim antes de entrar em casa e reporta agravamento das queixas 10 a 15 minutos após estar em casa. Neste caso a pergunta seguinte é saber se mora numa casa ou andar, em que piso e se deixa as janelas abertas para arejar a casa todo o dia. Neste caso probabilidade de ter alergia a pólens é a mais natural.
Exames complementares de diagnóstico
Nesta fase, sempre que possível, o nosso maior auxílio são os testes cutâneos por picada, a uma gama variada de alergénios, incluindo pólens diversos, testes estes que são muito rápidos de realizar pelo próprio especialista e muito sensíveis quanto às positividades encontradas.
Em alguns casos teremos que fazer a pesquisa de alergia através de análises sanguíneas, sobretudo nos casos em que o doente não consegue suspender anti-histamínicos uns dias antes da realização dos testes. Existem outro tipo de testes que poderão ser úteis no diagnóstico, mas realizados num menor número de casos.
Terapêutica dirigida
A positividade a alergénios específicos permite então um tratamento dirigido à causa do problema, que naturalmente varia de caso para caso. O tratamento passa por aliviar (de início) os sintomas do doente. Existem várias terapêuticas a instituir, assim como decidir se e quando e por quanto tempo poderá ter que realizar imunoterapia específica (as conhecidas vacinas antialérgicas). Estas devem ser prescritas apenas por imunoalergologistas, dado que farão as prescrições mais correctas em função do diagnóstico etiológico estabelecido.
Enquanto que com a instituição da terapêutica farmacológica clássica se obtém melhoria sintomática, a imunoterapia específica para o/os alergénios, vai modular a resposta do sistema imunológico do doente e a resposta deste aos alergénios desencadeantes.
No global, as vacinas antialérgicas apresentam excelentes resultados e são, atualmente, a melhor arma terapêutica contra este tipo de alergia. Existem algumas situações que constituem contra-indicações à precrição destas vacinas, como são os casos de doentes que têm associadas doenças autoimunes ou neoplasias.
Como dito acima, na primavera/verão também podemos ter doentes com reações alérgicas graves a picadas de abelhas e vespas. Nestes, a vacina é mandatória e eficaz em 98% dos casos.
É possível minimizar as alergias?
Evitar os desencadeantes da sua alergia é uma das formas de reduzir os sintomas
Estes doentes devem ser informados das estratégias para minorar sintomas de alergia como:
- Limitar atividades ao ar livre em dias com maiores contagens polínicas;
- Manter as janelas das habitações fechadas (também nos carros);
- Se em dias com elevadas contagens tiverem mesmo que andar no exterior deve tomar um duche e pôr a roupa a lavar (ex: pequenas particulas de pólen nos cabelos podem ser causa de sintomas de alergia durante toda a noite);
- Doentes com alergia grave a picada de abelhas ou vespas devem cumprir as normas anteriores e ainda usarem roupas escuras e que cubram a maior parte possível do corpo.
A cura definitiva ainda não existe, mas é possível, atualmente, na maioria dos casos, atingir-se um excelente controlo da doença, com obtenção de uma boa qualidade de vida e evitar, com o controlo da alergia, a sua progressão para formas mais graves como a asma em doentes que de início apenas padeciam de rinite alérgica.
Josefina Rodrigues Cernadas, Coordenadora da Unidade de Imunoalergologia
Hospital Lusíadas, Porto