Após a vitória do candidato brasileiro José Graziano nas eleições para a liderança do órgão para Alimentação e Agricultura das Nações Unidas (FAO), o prestígio internacional que o Brasil tanto quer será colocado à prova de bala.
Corpo do artigo
Para o especialista em Relações Internacionais da Universidade de Brasília (Unb), Virgílio Arraes, com a eleição de José Graziano da Silva, o Brasil adquire uma responsabilidade maior e deverá estar mais consciente do seu peso internacional.
"A vitória de Graziano é o primeiro feito importante em termos de política externa do governo Dilma e pode sinalizar uma orientação mais 'realista' daqui para a frente", avalia o professor, para quem o Brasil estava a perder tempo ao tentar ganhar a mesma importância que países como a Rússia ou a China no contexto mundial.
"Ao invés de ficar reivindicando um assento no Conselho de Segurança -- que é muito pouco provável que consiga -- O Brasil tinha credenciais para conseguir o cargo da FAO e apostou nisso", considera o professor.
Agora, porém, o Brasil terá de demonstrar se está amadurecido, ou não, para atuar nos organismos internacionais, além de estar "moralmente" mais comprometido com o orçamento da organização, que vem basicamente de doações dos governos.
Engenheiro agrónomo, Graziano da Silva tinha como principal credencial no seu currículo o facto de ter sido o coordenador do programa "Fome Zero", lançado pelo governo de Lula da Silva. Foi do próprio ex-presidente a iniciativa de indicar o seu ex-ministro para o cargo de uma das principais agências das Nações Unidas.
A partir de Janeiro, o governo de Dilma não só aceitou a sugestão de Lula da Silva, como se empenhou numa forte campanha que -- na opinião de Virgílio Arraes -- representou uma vitória da política externa actual, e não do ex-presidente Lula, de quem Dilma tem tentado diferenciar-se.
Por outro lado, junto com o bónus do prestígio internacional atingido, vem também o ónus financeiro.
Para Arraes, o Brasil não tem como fugir da responsabilidade de aumentar as suas doações para a organização, que possui um orçamento de aproximadamente 3,5 mil milhões de euros, sendo metade deste valor obtido por meio de doações de países membros.
"Moralmente, o Brasil, pelo porte de sua economia, terá de arcar com uma quantia maior no orçamento da instituição. De Senegal (país de origem do actual director, Jacques Diouf) ninguém cobraria mais, mas do Brasil certamente haverá expectativas", destaca o analista.
Outro ponto importante destacado por aquele responsável é o facto de tanto a Argentina quanto a África do Sul terem votado a favor do candidato brasileiro. A posição de ambos os países reflectirá a boa actuação da diplomacia brasileira nos blocos internacionais nos quais actua.
"A Argentina votou com o Brasil desde o início e isso é muito significativo, porque a negociação (com os argentinos) é sempre sofrida. E o apoio da África do Sul foi decisivo", apontou Arraes.
A Argentina possui rivalidades históricas com o Brasil e é um dos principais opositores à intenção do país de ocupar um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Já a África do Sul, passou a fazer parte recentemente dos BRICs -- grupo formado inicialmente por Brasil, Rússia, Índia e China --, e actua ainda ao lado do Brasil no BASIC -- fórum de debate que reúne Brasil, África do Sul, Índia e China.