
Liberdade e talento numa trama bastante imaginativa
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Filme de Jean-Christophe Meurisse estreia esta quinta-feira.
Teve estreia mundial numa das homéricas sessões da meia-noite do Festival de Cannes, dedicada a filmes mais populares. Venceu o Prémio do Público na última edição do Motel/X. São estes os dois grandes cartões-de-visita de "Laranjas sangrentas", que agora chega às salas e é tão delicioso que seria uma pena não saborear. Mesmo que por vezes o seu gosto seja um pouco amargo.
O filme começa por apresentar várias histórias que se vão cruzando aqui e ali, traçando, no final, um todo inesperadamente coerente. Por um lado, conhecemos um casal de idosos, afogados em dívidas e com o banco à perna, que aposta todas as fichas para a salvação financeira no prémio que esperam ganhar num concurso regional de dança.
Depois há um ministro da Economia e das Finanças de quem um jornalista descobriu ter na Suiça uma avultada quantia em dinheiro, pedindo aos assessores que esse facto nunca venha a ser revelado. Há também uma jovem virgem que tenta resolver esse "problema", discutindo-o com as amigas e com uma profissional de saúde, antes de entrar em ação. Finalmente, um jovem advogado em ascensão e um taxista malcriado vão cruzando várias destas histórias.
"Laranjas sangrentas" é, desde o princípio, uma auscultação irónica e criativa da sociedade francesa de hoje sob vários ângulos: a classe política, um sistema bancário que detém um poder enorme sobre os clientes, a assistência médica e social, os media cor-de-rosa... O lado mais desconcertante do filme chega a meio, quando passa do humor negro para o terror mais gore que se possa imaginar, com a entrada em cena de um psicopata digno de "Massacre no Texas".
Jean-Christophe Meurisse, argumentista e realizador do filme, tem vários créditos a seu favor: a coragem de ir até ao fim no desenvolvimento das sequências, doa a quem doer (e por vezes deve doer mesmo); a liberdade e o talento na construção de uma trama bastante imaginativa; a capacidade de pegar no espectador e o levar para onde quer, surpreendendo-o a cada esquina. A não perder, se tiver coragem.
Laranjas sangrentas
Jean-Christophe Meurisse
2021
