75% dos trabalhadores das artes performativas viveram situações de assédio moral

28,9% dos casos aconteceram em ambientes de formação
Foto: Arquivo
Cerca de 75% dos trabalhadores das artes performativas que participaram num inquérito nacional sobre assédio nas artes em Portugal admitiram ter vivido situações de assédio moral e metade reportaram casos de assédio sexual, segundo dados preliminares divulgados esta quarta-feira.
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Estes são os primeiros indicadores de um inquérito nacional lançado em julho pelo projeto MUDA - Assédio nas Artes em Portugal, destinado a fazer um levantamento de situações de assédio laboral e sexual e preparar respostas para melhorar o setor.
O projeto MUDA é coordenado por Catarina Vieira, Raquel André e Sara de Castro, ligadas à criação, investigação e formação em artes performativas, e tem com objetivo produzir conhecimento e criar ferramentas de combate e prevenção ao assédio entre quem trabalha nas artes.
Os resultados definitivos só serão conhecidos em março de 2026, tendo a organização divulgado hoje que foram consideradas 611 respostas ao inquérito, sobre episódios de assédio moral e sexual reportados por profissionais das artes performativas, tanto em contexto de trabalho como de formação.
Em algum momento do seu percurso nesta área, 49,8% dos inquiridos disse ter passado por situações de assédio sexual, e em 41% dos casos "envolveram pessoas em chefia ou direção artística".
Perto de 40% das pessoas que responderam ao inquérito disseram que nunca apresentaram "queixa, denúncia ou pedido de ação inspetiva a qualquer estrutura formal", para "evitar desgaste emocional" (19,6%), por "medo de consequências profissionais" (15,5%) ou por "falta de provas o testemunhas suficientes" (15,2%).
Dos casos de assédio sexual reportados, 28,9% aconteceram em ambientes de formação.
O estudo revela ainda que 74,8% dos profissionais inquiridos passou por uma situação de assédio moral e 11,6% admitiu viver ainda atualmente numa situação semelhante.
Também neste parâmetro de assédio laboral, 74% das situações aconteceram em "contexto de atividade remunerada" e 29,3% em ambiente de formação. A esmagadora maioria dos casos (76,9%) envolveu pessoas em cargos de chefia e direção artística.
Tal como nos casos de assédio sexual, a maioria dos inquiridos (70,2%) nunca fez denúncia ou queixa por assédio laboral, igualmente por medo de consequências (32,7%), para evitar desgaste emocional (42,1%), falta de testemunhas ou provas (22,1%) ou por não saber a quem recorrer ou como agir (15,2%).
Das 611 pessoas que responderam ao inquérito, 70% eram mulheres cisgénero, com uma média de idade de 38 anos, a viver em zona urbana (76,4%) e sendo trabalhadora "freelancer" (40,5%).
Dos inquiridos, 37,5% tinha um emprego a tempo inteiro e 39,1% trabalhava em mais do que duas entidades diferentes.
Sobre a análise dos dados, a organização alerta que a participação no inquérito "não permite afirmar que a amostra é representativa de todo o setor artístico em Portugal".
Em julho, quando o inquérito foi lançado, a investigadora Dália Costa, do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, dizia à Lusa que eram são esperadas pelo menos entre 400 a mil respostas.
"Todo este projeto tem como grande finalidade fazer um mapeamento das situações de assédio e com uma intenção muito clara, transformadora. [...] Queremos saber que pessoas, com que idade, com que identidade de género, com que vulnerabilidade do ponto de vista da deficiência" têm situações a relatar, enumerou a investigadora.
De acordo com o Instituto Nacional de Estatística, em 2023, a população empregada no setor cultural e criativo em Portugal era de 201 mil pessoas.
