"Please please please" é uma das peças mais desejadas do DDD, e é a única que só poderá ser vista presencialmente. Estreia em Portugal esta quinta-feira.
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Vivemos num estado de alerta e de desesperança, a pandemia fez-nos tartarugas de carapaça ao contrário. Nesta época em que muita gente quer que tudo volte a ser como dantes, Tiago Rodrigues, Mathilde Monnier e La Ribot- santa trindade das artes performativas- mostram-nos, em "Please, Please, Please", que talvez esta seja a porta de emergência para fazermos tudo de forma diferente.
A obra estreou antes de sonharmos o que estava por chegar, permitindo uma análise fria sem saudosismos. O retrato de uma sociedade neoliberal e a herança que deixou bebe inspiração na filha do encenador, aqui também coreógrafo, Tiago Rodrigues, e nos testemunhos que vamos deixar à sua geração. A partir de um relato em que há um recém-nascido que fala duas línguas começa a problematização. Há também uma criança, super-heroína, cujo poder é a desesperança. Porque a esperança é a fonte dos males.
O trabalho já foi apresentado nos maiores festivais de artes performativas da Europa (Festival d"Automne, em Paris; Festival Grec, em Barcelona), mas ainda não passou por Portugal. Será esta quinta-feira, dia 22, às 19 horas.
Executando um plano em que o texto e a dança aparecem em igual medida, os três criadores fazem um acordo extracontratual pelo não cumprimento de nenhuma de suas promessas. A premissa básica permite-lhes olhar para a indisciplina do corpo e colocá-lo em oposição à disciplina das instituições sociais. Um espetáculo híbrido que mostra o que de melhor se pode alcançar num formato de teatro-dança, ou dança-teatro.
A tempestade perfeita
Depois de uma primeira experiência com a coreografia "Gustavia" (2017), La Ribot, espanhola naturalizada suíça, decidiu voltar a juntar-se com a francesa Mathilde Monnier. A espanhola é uma artista inconformada, mas com uma sólida base de clássico, o que lhe permite encontrar pontos de contacto com a diretora do Centro Coreográfico Nacional de Montpellier. Monnier foi vencedora do Prémio Nacional de Artes performativas do Ministério da Cultura francês em 1999 e criadora de dezenas de espetáculos para o Festival de Avignon, Londres, Berlim, Paris que a tornaram num marco da dança contemporânea francesa.
Em 2020, María La Ribot ganhou o Leão de Ouro de Dança pela sua Carreira na Bienal de Veneza. A presidente do júri Marie Chouinard afirmou então que o prémio era "um reconhecimento à trajetória de uma artista total, cujo trabalho excede os limites da dança e resiste a qualquer classificação". Em 2019, ganhou o Swiss Grand Award for Dance, e em 2000 o Prémio Nacional de Dança espanhol. Mas como os seus trabalhos, desde a década de 80, extrapolam a dança, conseguiu somar, também, em 2016, o Prémio Nacional de Belas Artes espanhol. Estudou com Vittor Ullate e Carmen Roche e também se interessou pelas técnicas de contemporâneo que apurou em Nova Iorque e em Colónia.
Para a receita de "Please, please, please" há a acrescentar Tiago Rodrigues, Prémio Pessoa 2019, o mais jovem diretor de um Teatro Nacional (D. Maria II) e multipremiado encenador. Aos 26 anos, começa a trabalhar como professor convidado na escola de dança contemporânea PARTS, em Bruxelas, dirigida pela coreógrafa Anne Teresa De Keersmaeker.
Depois disso, dá aulas em diversas escolas de teatro e dança em Portugal, entre as quais a Universidade de Évora, Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo, Balleteatro e Escola Superior de Dança de Lisboa. Em 2015, cria também "A perna esquerda de Tchaikovsky" a convite da Companhia Nacional de Bailado e a partir daí forma-se a tempestade perfeita.