Só há duas certezas sobre o que vai acontecer: o final chega hoje e a polémica vai ter o tamanho de um Mundo inteiro colado aos ecrãs.
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Pode haver uma guerra sem mortes injustas de civis ou em que os mais frágeis não sofram duras agruras? Sem cidades cruelmente dizimadas? O bombardeamento de Berlim, nos últimos dias da II Guerra Mundial, e a destruição provocada pela chuva de fogo dos Aliados sobre as cidades alemãs eram realmente obrigatórios? A História decidiu que sim, que foram males necessários, mas as histórias de guerra são normalmente ambíguas.
Mais uma pergunta (a partir de agora há spoilers), desta vez na voz de Jorah Mormont, fiel protetor e conselheiro, dirigida à sua rainha, Daenerys Targaryen: "Conhece alguma guerra em que não tenham morrido inocentes?". À terceira temporada de "A guerra dos tronos", já a "Quebradora de correntes" (outro dos seus muitos nomes) tinha perdido a inocência e anunciado o seu destino: fazer o que fosse preciso para conquistar o trono que julga ser seu por direito.
A série sempre foi exercício de gestão de ambiguidades. A "realpolitik" a misturar-se com a coragem no campo de batalha; a justiça com a crueldade; o horror com a honra; o messianismo do Bem com a inevitabilidade do Mal. Dany foi construída a partir de polos opostos, mas fomos preferindo acreditar que, no final, a versão limpa iria prevalecer. Os justos dragões contra contra os criminosos leões que mandam e abusam em Westeros, o continente governado a partir do cobiçado Trono de Ferro. E é por isso que pelo menos 3200 crianças, nos EUA, se chamam "khaleesi", mais um nome da Targaryen poderosa, amada e preferida dos espectadores.
petição e Histeria
"Helás", as guerras, mesmo as mais justas, são sujas e sangram, matam e transformam protagonistas. E o poder corrompe, a ambição corrói, a traição magoa.
A oitava e última temporada da série baseada na saga "As crónicas de gelo e fogo", de George R.R. Martin, estava já longe de ser consensual (houve críticas ao ritmo apressado, à realização dos episódios, a buracos na narrativa). Mas depois do episódio do último domingo, o mais visto de sempre da série, aconteceu o que nunca tinha acontecido. Um milhão de fãs assinaram uma petição para que a temporada que hoje termina seja refeita, porque a rainha boa - movida a raiva, loucura ou sentido histórico de justiça - cometeu uma atrocidade sem nome e fez chover fogo sobre a capital do reino. Matou inocentes, desiludiu fãs, críticos e, pelo menos, os pais de 3200 crianças.
O acontecimento narrativo (para os indignados, uma espécie de aproximação acelerada a Walter White, de "Breaking Bad") provocou histeria e tomou conta da Net. Os criadores da série, D.B. Weiss e David Benioff, foram injuriados. Grandes e pequenas teorias foram confirmadas, dizimadas e dissecadas em discussões furiosas, tão apropriadamente coincidentes com o ar dos tempos.
Esqueceram-se que a"A guerra dos tronos" sempre foi assim, fraturante. Agora, tantas violência e morte depois, a sorte de todos será lançada. E a história da maior e mais cara série de TV de sempre, a série de todos os superlativos, vai terminar. Terá certamente um final condizente com a sua própria dimensão, pleno de opções duvidosas e momentos exasperantes e inesquecíveis.
Se achou que o fim de "Os Sopranos" e de "Lost" geraram controvérsia, prepare-se. A discussão sobre o último capítulo de "A guerra dos tronos" começa já amanhã e nunca terminará. A Internet, como o povo do Norte de Westeros, nunca esquece.