A Humanidade perdida na indiferença pelo outro

Sobre “Killer Joe”, peça escrita nos anos 90 por Tracy Letts, dizia o dramaturgo americano, em entrevista, como se tinha inspirado nas histórias ‘noir’ onde o ponto comum eram “pessoas que queriam as coisas com muita intensidade; e que tomavam decisões terríveis, na tentativa de obtê-las”.

Acabou por escrever um texto que é mais do que isso: é a humanidade perdida na indiferença, a decadência no desespero e na disfuncionalidade, um drama cortante que é reinterpretado a partir de sábado no Teatro São Luiz, em Lisboa, com encenação de Miguel Graça e interpretação de David Esteves, Dinarte Branco, Inês Pereira, Madalena Almeida e Pedro Caeiro.

Escrita em 1993, “Killer Joe” foi a primeira incursão na dramaturgia de Letts, ator vencedor de um Tony. A peça foi condenada pela violência, mas acabaria por perseverar, chegando a Hollywood em 2012, num filme com Matthew McConaughey, e depois à off-Broadway e West End, com Orlando Bloom, onde recebeu críticas positivas, a inteligência no texto a contrabalançar a obscuridão e a conseguir, no desconforto, passar a mensagem.

A peça acompanha os Smith, família disfuncional a viver numa autocaravana em Dallas, Texas. O núcleo é composto pelo pai, Ansel, o filho, Chris, a madrasta Sharla e a filha mais nova, Dottie. Na pobreza dos “trailer parks”, numa situação financeira difícil, a família decide contratar um assassino, Joe Cooper, para assassinar a ex-mulher de Ansel e reclamar o dinheiro do seguro.

De forma crua e sem artifícios, a peça expõe a decadência moral, a violência e o egoísmo, “uma metáfora para a consequência das redes sociais que já se adivinhava nos anos 90”, e para uma sociedade “cada vez mais autocentrada, narcisista e niilista”, lê-se na sinopse.

Numa realidade decadente e extrema, os Smith confrontam-se com um espelho do que são e com a inevitabilidade da tragédia, como consequência das suas decisões.

Killer Joe
Teatro São Luiz, Lisboa
De 14 a 22 de junho