Edição digital do primeiro disco marca o arranque de um ambicioso plano que prevê conquista de novos públicos.
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Indisponível nas lojas há vários anos, a obra discográfica de José Afonso começa finalmente esta sexta-feira - data em que se celebra o Dia Mundial da Música - a ser reeditada. Para já, vai ser lançada apenas uma edição digital de "Cantares de andarilho", o seu primeiro álbum de originais, mas até final do próximo ano toda a obra estará disponível em três formatos (vinil, digital e CD), colocando termo a uma ausência nos escaparates que muito penalizou a circulação recente das suas músicas, sobretudo junto das novas gerações.
O plano de edições até ao final do ano vai debruçar-se sobre os três primeiros discos ("Cantares de andarilho", "Contos velhos, rumos novos" e "Traz um amigo também"), editados entre 1968 e 1970, prevendo-se que os restantes oito saiam mensalmente a partir de março de 2022.
Objetos de particular curiosidade por parte dos colecionadores, as edições em vinil só deverão começar a ser lançadas no final de novembro, devido aos atrasos globais nas entregas.
Para Nuno Saraiva, "label manager" da Lusitanian Music, a "honra extrema" que significa ter sido o produtor fonográfico escolhido pelos familiares de José Afonso para reeditar a sua obra é ainda maior "porque nunca me passou tal pela cabeça". A imersão plena que fez na discografia afonsina no último par de anos só veio acentuar a sua convicção de que "a grandeza da sua obra não tem paralelo na nossa história musical".
"Igual a Gainsbourg"
Para o triunfo da sua proposta contribuíram triunfos como a masterização integral a cargo dos mais destacados engenheiros de som da atualidade (como Florian Siller, do Soundgarden Studio, em Hamburgo). O resultado, garante o responsável das edições, irá surpreender até os mais exigentes: "Acredito que a masterização em CD vai superar as anteriores, enquanto o vinil rivaliza com as edições originais".
Fator importante também terá sido o plano de difusão internacional. Graças às parcerias feitas, as edições físicas dos discos vão chegar a França, Alemanha e Inglaterra, havendo ainda a possibilidade de, através de encomendas junto da distribuidora internacional, poderem ser feitas remessas para qualquer parte do Mundo.
Um dos principais enfoques da Mais 5, a etiqueta que irá comercializar as edições, é a componente digital. Nas próximas semanas vão arrancar campanhas promocionais em vários países que pretendem dar a conhecer os discos de José Afonso junto de novos públicos e mercados. "Estamos a falar de um artista que deveria estar no mesmo patamar de reconhecimento internacional de um Serge Gainsbourg", acredita Saraiva.
O otimismo do produtor não é alheio às matizes variadas dos seus discos, que tanto tocam a "folk" de intervenção como exploram cruzamentos estéticos e influências de outras paragens, como a música de origem africana.
Uma das ideias a concretizar no futuro poderá passar pelo convite a músicos estrangeiros para interpretarem temas de Zeca. O impacto imediato que teve a versão de "Grândola, vila morena" feita por Cecilia Krull para a série espanhola "A casa de papel" poderá ser replicado em larga escala, "se for esse o entendimentos dos familiares".
Reedições
"Cantares de andarilho" (1968)
O primeiro álbum de originais de José Afonso marcou também o início da sua profícua relação artística com a Orfeu, fundada por Arnaldo Trindade. Foi gravado em estúdio num só dia.
"Contos velhos rumos novos" (1969)
É considerado o seu disco "mais rústico". Marcado pela tentativa de renovação da música tradicional, seria precursor de um sem-número de obras que procuraram o mesmo fim.
"Traz outro amigo também" (1970)
Com um reconhecimento crescente, José Afonso viajou até Londres para gravar um novo disco nos estúdios PYE, assinando uma obra ambiciosa, com maior complexidade formal.