Marco Bellocchio celebra vida efémera de irmão gémeo em "Marx Pode Esperar"
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Nascido a 9 de novembro de 1939, em Piacenza, na Emilia-Romagna, Marco Bellochio é um dos nomes de referência do cinema italiano, e mundial, sem qualquer favor, dos últimos quase sessenta anos - sua primeira longa-metragem, "I Pugni in Tasca", data de 1965 e, dado o seu conteúdo político, nunca estreou no Portugal da ditadura e da censura.
Na realidade, Bellocchio, cuja carreira se sucede à da geração oriunda do neo-realismo e do pós-guerra, integrou um grupo de cineastas que, à semelhança de outras paragens, assinava um cinema de rotura com o sistema, abordando por vezes de forma mais direta a sempre conturbada vida política italiana, sempre de mãos dadas com a igreja.
Nesse sentido, filmes como "Em Nome do Pai, "O Monstro na Primeira Página" ou "Marcha Triunfal" marcaram uma época. Bellocchio, no entanto, soube sempre renovar-se, adaptou clássicos, como Pirandello, arrojou numa sexualidade libertária e explícita que praticamente custou a carreira a Maruschka Detmers e, acima de tudo, foi sempre deixando nos seus filmes elementos subtilmente autobiográficos.
Ora, uma situação que Bellocchio deixou praticamente apenas em família foi a existência de um irmão gémeo e o suicídio deste, em 1968. Em conversa recente com o JN, a propósito do filme, o realizador confessava a angústia por não ter percebido os sinais que levariam Camillo Bellocchio a tal gesto e por não o ter conseguido ajudar a vencer o estado depressivo.
Atingida já uma certa idade - Bellocchio é octogenário - o realizador percebeu que chegara a hora de prestar homenagem ao irmão, assinando este comovente documento, cujo título não reflete uma qualquer angústia sobre o estado atual das ideologias, referindo-se isso sim a uma frase que o irmão muitas vezes dizia, perante os desejos de uma revolução mais imediata por parte de Marco: "Marx Pode Esperar"!
Mestre das narrativas, com mais de meia centena de filmes pensados e executados, Bellocchio reúne depoimentos de familiares e excertos de filmes seus, fazendo dessa forma, não só um tributo familiar como uma resenha da sua obra e da vida política italiana das últimas décadas. E este filme não vai esperar muito por si, é ir vê-lo...