"O hóspede da casa do infinito" é uma porta de entrada para a loucura não confirmada do poeta.
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Os últimos 36 anos do poeta-tradutor alemão Friedrich Hölderlin (1770-1843) correspondem à segunda metade da sua vida e obra e coincidem com a exposição de Avelino Sá, patente na Galeria Fernando Santos, no Porto, até 7 de maio. "O hóspede da casa do infinito" - reunião de 21 pinturas de grandes dimensões na sua habitual técnica de encáustica sobre madeira, mas com recurso a tonalidades que rasgam os padrões do autor, e ainda 31 desenhos intitulados "A torre" - é talvez a porta mais sublime para aceder à nunca confirmada loucura de Hölderlin que, por fim, reconhecendo-se nas palavras mas já não no nome, assinava Scardanelli.
Sobre a primeira metade da vida de Hölderlin, no século XVIII, interessaram-se muitos compositores. Brahms, Strauss e Ligeti são apenas alguns dos que sobre a sua poesia compuseram música. A última metade, em que foi considerado incurável, passando a viver exilado numa torre por compaixão do carpinteiro Ernst Zimmer e, mais tarde, da filha, em Tübingen, nas margens do Rio Neckar, no sudoeste da Alemanha, não interessou a quase ninguém na música (Heinz Holliger é exemplo raro) e muito menos na pintura.
Em contramão, Avelino Sá, devoto do romantismo alemão e de autores que de certa forma auto-excluíram-se da sociedade, como Paul Celan ou Robert Walter, encontrou na poesia de Scardanelli e, como escreveu Bernardo Pinto de Almeida no catálogo da exposição, na "humildade do dizer", terreno fértil para tocar a beleza do intocável, criando, pela pintura, pistas para o interior e o tempo de Hölderlin. Cada obra é uma fresta de uma janela através da qual espreitamos as quatro estações do poeta.
Pela primeira vez, a galeria Fernando Santos, onde Avelino Sá expõe desde 2008, encomendou um vídeo sobre o artista por altura da inauguração da mostra. Era muito importante que este investimento fizesse escola nas galerias, cuja finalidade não deveria esgotar-se na comercialização mas também na democratização e no conhecimento sobre os artistas em que se escolhe apostar.
O hóspede da casa do infinito
Galeria Fernando Santos, Porto
Até 7 de maio