Nova coleção da Devir inaugura uma colecção de obras distinguidas com o Grande Prémio de Angoulême.
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"A Trilogia Nikopol", que esta semana regressou às livrarias portuguesas com a chancela da Devir, inaugura uma colecção que vai recuperar oito das obras distinguidas com o Grande Prémio de Angoulême. Como senão, regista-se o formato livro que, se é bem aceite pela planificação e o grafismo de alguns autores, noutros dificulta a leitura.
Publicada originalmente entre 1987 e o início do século XXI, A Trilogia Nikopol (nome de uma cidade ucraniana...) cuja acção decorre em 2023, revela-se de uma antecipação assustadora, antevendo o crescimento das ditaduras, as improváveis coligações, a decadência da linguagem e da educação, alianças políticas e militares contra-natura, o crescimento da inteligência artificial, a escassez de recursos, a preocupante promiscuidade entre os poderes político e religioso, o aumento do fosso entre alguns privilegiados e a maioria da população... Podia ser o desfiar de notícias de um qualquer telejornal dos nossos dias.
A história tem início numa Paris futurista e distópica, após duas guerras nucleares, formada por uma zona central onde habitam os ricos e poderosos e uma zona circundante onde a degradação das condições de vida é notória. Ameaçada por uma pirâmide habitada por antigos deuses egípcios imortais, a cidade vê regressar à Terra uma cápsula espacial lançada três décadas antes, no interior da qual se encontra Alcides Nikopol que passou esse tempo em hibernação criogénica.
Embora cada uma das narrativas - A Feira dos Imortais, A Mulher Armadilha e Frio Equador - possa ser lida de forma independente, juntas formam um retrato mais amplo.
O traço de Bilal, apoiado por um notável trabalho de cor, é magnifico na criação de uma atmosfera tensa e sobrecarregada, num relato que decorre à sombra opressiva das memórias das ditaduras comunistas, numa estranha combinação de passado e futuro com saltos e indefinições temporais, humanidade e imortalidade, e realidade palpável, utopias, distopias e paranóias que, concretizadas ou apenas sugeridas, obrigam a leitura mais atenta e apelam à capacidade de ir preenchendo ou interpretando o que nalguns casos é apenas sugerido.