25 anos depois do lançamento de “Moon safari”, o álbum de estreia dos franceses foi a estrela na primeira noite do Ageas Cooljazz, esta terça-feira em Cascais. Além do disco seminal do duo, tocado na íntegra e por ordem, o público teve direito a outras viagens, por outros dos seus mundos.
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Estávamos em janeiro de 1998, em pleno inverno, e Nicolas Godin e Jean-Benoît Dunckel, dois estudantes franceses apaixonados por música clássica e eletrónica - entre ídolos e referências não tão óbvias, de Pink Floyd a Beatles –, lançavam um disco que surpreendeu o mundo: surpreendeu até os seus criadores, que admitiram ter investido tudo nele, um “all in” para vingar, sem nunca porém sonhar que, ao vingar, mudariam não só a sua vida como criariam uma sonoridade própria e impactariam gerações.
“Moon safari”, álbum que trouxe ao mundo temas como “All I need”, “Sexy boy”, “Talisman” ou “Kelly watch the stars”, viria a ser um marco na história da música, até hoje: mais de 25 anos – tecnicamente, 26 – depois, o álbum não envelhece, porque era e continua perfeito, em disco ou ao vivo, como provou o duo esta terça-feira, na primeira noite da edição de 2024 do Ageas Cooljazz em Cascais.
Safari nostálgico
Quando surgiram, os Air foram uma lufada de ar fresco num final de anos 90 um pouco polarizados entre pop, indie e rock - mas não vinham sozinhos. Os conterrâneos Daft Punk já tinham aberto as portas da “french house”, da qual seriam também marcantes nomes como St Germain ou Laurent Garnier, havia um movimento a nascer.
Só que “Moon safari” mudou tudo: o tipo de mundo ou de ambiente sonoro criado, a pop eletrónica, etérea, melancólica, chill out, downtempo, nostálgica, cinemática, eclética, vintage, com um toque de chanson francaise misturado com robótica, com o chamado spacepop que o disco lançou, tudo junto, foi tudo novo e especial – continua a ser.
Até porque, talvez pela época, o ambiente de fim de século que então se vivia, a idade de quem ouvia ou acolhia este tipo de música, até a
essência melancólica e vintage do som, o álbum tornou-se facilmente num símbolo, uma banda sonora de vida para muitos – e muitos estavam no Cooljazz, esta terça-feira.
Ao vivo, 22.30h (hora marcada) em ponto, entraram as primeiras e inconfundíveis notas do tema de abertura, “La femme d'argent”. 10 minutos dura a música, um crescendo galopante no final que termina para dar entrada a “Sexy boy”, já a sequência mágica do disco - que até na ordem dos temas parecia abençoado - a resultar.
Os dois de branco, Godin e Dunckel, com um baterista, afiguram eles próprios quase os mesmos de há 25 anos, intemporais como o seu álbum, que vai sendo tocado sob fundos monocromáticos e abstratos ou temas estrelares e espaciais, talvez para ajudar no caminho do safari à Lua.
O duo vai agradecendo, em português, francês e inglês, Jean-Benoît Dunckel solta um tímido “we love you”, os Air não são conhecidos pela comunicação em palco, mas parecem felizes, divertidos.
São, isso é certo, famosos por mudar as músicas ao vivo, trocar arranjos, e desta vez quase não o fazem possivelmente por respeito à estrutura do disco. Quase: é mais forte do que eles e há detalhes diferentes, sendo em “All I need” que se nota a maior mudança, aqui na parte cantada por Beth Hirsch e porventura para minorar a ausência de uma voz feminina em palco, numa música com tanto vocal. Uma solução compreensível mas que traz um pouco de desencanto num tema tão icónico – que tinha um vídeo igualmente icónico, do casal no skate park.
À frente, em “You make it easy”, o duo volta a preferir colmatar a ausência de Beth cantando com recurso ao autotune e não usando gravações; mas pelo meio ainda ouvimos “Kelly watch the stars” e o bonito “Talisman”, voando depois o tempo pelo resto do disco até ao último “Le voyage de Pénélope”.
44 minutos e a vida depois
“Moon safari” é um disco perfeito mas curto: tem 44 minutos e pouco mais durou ao vivo. Quando terminava em CD, simplesmente se deixava dar a volta e logo entrava novamente “La femme d'argent”, e já não havia como tirar.
Ao vivo, não dá para dar a volta mas os Air compensam o público com outros temas do seu percurso, que na verdade não se limitou, nem de perto, ao seu primeiro disco. Em Cascais, saem depois de concluir a viagem pelo passado lunar e voltam para uma espécie de segunda parte, mais do que encore, onde tocam ainda músicas como “Venus”, “Cherry blossom girl” ou uma, muito bem acolhida, versão instrumental de “Playground love”, tema de “Virgens suicidas” de Sofia Coppola, em 2000.
Já no encore, “Alone in Kyoto” e “Electronic performers” lembram ao público como os ambientes criados pelo duo continuaram icónicos, especiais, espaciais, por vezes perfeitos, muito além e depois do seu disco seminal.
Antes dos Air, pelo Hipódromo Manuel Possolo passaram Marwan o jazz eclético da luso-croata Lana Gasparotti. O Cooljazz continua até ao final do mês e recebe esta quarta-feira, dia 10, Chaka Khan. Morcheeba, Onoma e Alex D’alva Teixeira Dj Set.
Atuam ainda Dino D'Santiago e Maro (19 de julho), Diana Krall (26), Marina Sena e Luedji Luna (27), Fat Freddy's Drop e Expresso Transatlântico (30) e Jamie Cullum e Inês Marques Lucas, a 31 de julho, entre outros. Há também noites de DJ set gratuitas, nos jardins da Casa das Histórias Paula Rego, a 14, 21 e 28 de julho.