"Álbum silencioso": Kate Bush lidera músicos britânicos na luta contra inteligência artificial
Mais de mil músicos, entre os quais Kate Bush, Annie Lennox e Damon Albarn, lançaram esta terça-feira um álbum silencioso em protesto contra as alterações propostas à legislação britânica em relação aos direitos de autor no domínio da inteligência artificial (IA), que, segundo eles, legalizarão o roubo de música.
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O álbum “Is This What We Want”, que inclui gravações de estúdios e espaços de atuação vazios, faz parte de uma reação crescente contra os planos do governo.
Numa carta enviada ao jornal "The Times" esta terça-feira, escritores e músicos, incluindo Bush, também denunciaram as propostas como uma “oferta generalizada” a Silicon Valley.
Entre os outros signatários destacam-se também Paul McCartney, Elton John, Ed Sheeran, Dua Lipa e Sting, bem como os escritores Kazuo Ishiguro, Michael Morpurgo e Helen Fielding.
Numa ação muito rara, os jornais britânicos também manifestaram as suas preocupações, lançando a campanha “Make it Fair”, que inclui anúncios na capa de quase todos os diários nacionais, com um editorial dos editores dos jornais.
O governo trabalhista do primeiro-ministro Keir Starmer está a considerar a possibilidade de rever a lei para permitir que as empresas de IA utilizem os conteúdos dos criadores na Internet para ajudar a desenvolver os seus modelos, a menos que os detentores dos direitos optem por não o fazer.
No entanto, os artistas consideram que essa opção será difícil e onerosa.
Ed Newton-Rex, produtor de álbuns, afirmou que os músicos estão “unidos na sua condenação total deste plano mal pensado”.
“A proposta do governo entregaria o trabalho de toda a vida dos músicos do país a empresas de IA, de graça, permitindo que essas empresas explorassem o trabalho dos músicos para os ultrapassar”, afirmou.
“É um plano que não só seria desastroso para os músicos, como é totalmente desnecessário. O Reino Unido pode ser líder no domínio da IA sem atirar para debaixo do autocarro as nossas indústrias criativas, que são líderes mundiais”, acrescentou.
"Catastrófico"
O lançamento do álbum foi programado para coincidir com o fim da consulta pública do governo sobre as mudanças propostas.
Starmer já tinha referido anteriormente que o governo precisava de “encontrar o equilíbrio certo” entre os direitos de autor e a IA, ao mesmo tempo que referiu que a tecnologia representa “uma enorme oportunidade”.
Os autores também se pronunciaram sobre os planos do governo britânico.
Na semana passada, o escritor norte-americano Scott Turow criticou a “atitude arrogante do governo britânico”, que, segundo ele, propôs “permitir que as grandes empresas de tecnologia raspem todos os nossos livros e reembalem as nossas palavras como ‘conteúdo original’”.
“Em vez de tentar impedir isso, o governo britânico quer dar-lhes um passe livre. Isso será catastrófico, não só para os escritores do Reino Unido, mas de todo o mundo”, escreveu no "Daily Mail"
Numa entrevista em janeiro, McCartney, de 82 anos, um dos dois membros sobreviventes dos Beatles, disse à BBC que qualquer nova legislação tinha de proteger os pensadores criativos e os artistas, avisando que “não os vamos ter” sem isso.
“Há jovens rapazes, raparigas, que escrevem uma bela canção e não são donos dela, nem têm nada a ver com ela. E qualquer pessoa que queira pode simplesmente roubá-la”, disse ele.
“A verdade é que o dinheiro vai para algum lado... Alguém está a ser pago, então porque não há-de ser a pessoa que se sentou e escreveu 'Yesterday'?”
Em 2023, a música britânica contribuiu com 7,6 mil milhões de libras (cerca de 9 mil milhões de euros) para a economia do Reino Unido, com as exportações de música britânica a atingirem 4,6 mil milhões de libras (cerca de 5,5 mil milhões de euros).