André Diniz: "Sabia que a história se repete, mas ver acontecer na prática é assustador"
Autor brasileiro apresenta "A revolta da vacina", este fim de semana no Amadora BD 2021.
Corpo do artigo
André Diniz, autor de banda desenhada brasileiro, vai passar pelo Amadora BD para apresentar "A revolta da vacina".
Trata-se de uma banda desenhada sobre a epidemia de varíola que afetou o Brasil em 1904 e levou mesmo à vacinação compulsiva, à necessidade de ter um certificado de vacinação para aceder a locais públicos e a uma revolta popular contra as forças da ordem.
Natural do Rio de Janeiro, onde nasceu em 1975, mas a residir em Portugal desde 2017, contou ao Jornal de Notícias que o tema lhe foi sugerido "em 2007 por Alexandre Linares, o meu editor na época". Na altura, o projeto não avançou, mas "como já tinha pesquisado sobre o tema e imaginado o protagonista, segui em frente, por conta própria".
Documentar-se sobre a época não foi difícil. "A Internet, não sendo como hoje, já foi fundamental e a pesquisa de imagens de época foi fácil, pois já era colecionador de livros de fotografia sobre o Rio de Janeiro antigo, um período visualmente fascinante."
André Diniz revela que "esta foi a minha BD com o caminho mais longo: entre a ideia inicial e a presente edição, escrevi diversas versões do argumento, fiz muitas modificações, tentei afastar-me do protagonista". A figura principal de "A revolta da vacina" é Zelito, um jovem recém-chegado do interior que quer ser desenhador de imprensa. Conciliar "uma história e cenários reais com o protagonista fictício, com uma história própria também criada por mim, foi um desafio". Por isso, a versão agora editada é a terceira que o autor escreveu e desenhou.
Dados dias que se vivem, é inevitável querer traçar um paralelismo entre a epidemia de 1904 e a covid-19, e André Diniz contou ao JN que a nova edição "foi claramente motivada pela situação atual. Não 'só' pela pandemia, mas também pelo momento político no mínimo absurdo que o Brasil atravessa". E acrescenta: "A primeira versão do argumento foi escrita há mais de dez anos, era uma BD sobre História e passado. De repente, tornou-se atual". E admite: "Já sabia que a história se repete, mas ver acontecer na prática é assustador".
Diniz considera que as semelhanças entre as duas situações "são muito mais sociais e políticas do que da epidemia em si. Tudo o que vemos acontecer no Brasil hoje já existia em 1904: as fake news, o negacionismo, o oportunismo político e a ignorância do povo - muito mais justificável na época do que hoje, não só pelo acesso à informação, mas também porque o Brasil de hoje é um país que já foi referência mundial em campanhas de vacinação, ao contrário de uma época em que a própria ideia de vacinação em massa por si só já era algo estranho".
Questionado sobre o que transforma uma epidemia num bom tema ficcional, responde que "é uma história protagonizada principalmente por anónimos, pelo povo, por gente simples e comum". Dessa forma, "não só posso como tenho que criar personagens fictícias com histórias próprias, o que é a parte mais fascinante. Sempre gostei dessa combinação, de criar ficção em contextos reais".
A edição portuguesa de "A revolta da vacina" tem chancela da Polvo e vai ser apresentada no Amadora BD 2021, que está a decorrer no Ski Skate Amadora Park, no dia 30 de outubro, às 14.30 horas, com a presença do autor e do editor, Rui Brito.
Na ocasião, André Diniz apresenta outra obra sua, "Matei o meu pai e foi estranho".