Artista brasileira apresentou em Amarante o espetáculo mais completo da sua carreira. Este domingo, sobe a palco Dino D’Santiago.
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As mudanças anunciadas durante a tarde de sábado para o festival MIMO não abrandaram o ambiente de festa que se fazia sentir nas ruas de Amarante. Ainda assim, a expectativa para a noite era muita. Com o cancelamento da cabeça de cartaz dessa noite – e a artista mais aguardada de todo o programa – como é que ficariam os ânimos? Surpreendentemente, mais do que entusiasmado. E há uma responsável: Ákila a.k.a. Puta da Silva.
A artista brasileira subiu a palco à hora já planeada (foi uma das que não viu a sua atuação reagendada). Pelas 21.30 horas em ponto, no entanto, não foi Ákila que se fez ouvir, mas antes uma espécie de hino português que tem sido marca particular deste ano em que se celebram 50 anos do 25 de Abril – a banda entrou em palco e entoou “Grândola, Vila Morena”. As colunas, ainda que com o som no pico, foram rapidamente suplantadas pelas vozes dos espectadores. Com dezenas de punhos no ar, fomos como que transportados para uma emoção coletiva de luta que estabeleceu o tom para o concerto de 1.30 horas que se seguiria.
Numa noite de mudanças, Puta da Silva e as suas múltiplas facetas, da artista à ativista, passando pela travesti, sempre pautadas pela sensualidade e ousadia, conquistaram o público amarantino. Até mesmo aquele que, de início lhe parecia torcer o nariz. Contemos a história pelo lado de cá, fora do palco.
Conquistou os locais
A cantora apareceu num fato de corpo inteiro, justo e com transparências, sob um imponente casaco verde. Algures pela primeira ou segunda música, um senhor de aparência na casa dos 60 anos questiona a filha sobre aquela figura no palco que lhe é estranha. Pacientemente, ouve, aceita e compreende aquilo que a mais nova lhe explica. A curiosidade e consternação deram adiante lugar ao entusiasmo, principalmente quando, numa versão de samba, se ouviu Ákila cantar “eles comem tudo e não deixam nada”. A canção “Vampiros”, de Zeca Afonso, foi o apogeu da unanimidade – qual não foi o uníssono então ouvido.
Quanto ao agora, parece, novo fã de Puta da Silva, nunca mais largou o telemóvel, gravando para memória futura – ou talvez para mostrar aos amigos no próximo café – todo o espetáculo, do início ao fim. Este foi, aliás, o reflexo de muitos locais, concentrados principalmente pela escadaria lateral ao palco, que nem com a chuva que se fez sentir aqui e acolá durante o concerto arredaram pé.
Dos mais velhos aos mais novos, brasileiros e portugueses, dos mais excêntricos aos mais tímidos, Puta da Silva parece ter alcançado o dom de unir as massas, num momento de arte que foi inerentemente político sem ter de se vangloriar com esse porta estandarte. Sobre bandeiras, houve duas em palco. Já perto do final, os símbolos de Portugal e do Brasil pendiam um em cada mão da artista, a imagem que resume aquilo que o MIMO se tem tornado e que, este ano, apenas reforçou: a união das duas terras.
Problemas técnicos no palco
A produção é a mais completa até agora na carreira de Puta da Silva, desde a atuação irrepreensível da banda, aos visuais, ao guarda-roupa e passando pela presença da dupla de bailarinos magistralmente mexendo-se ao som do que foi uma montanha-russa entre samba, rock, punk e intervenção. Para ser perfeito só faltou o que é alheio à brasileira – a qualidade técnica, tendo-se feito notar durante todo o festival, mas principalmente neste concerto em que a palavra é fundamental, que o balanço entre graves e vozes não estava no ponto.
Este domingo à noite há ainda Femi Kuti & The Positive Force, o cabeça de cartaz Dino D’Santiago e encerra com o reagendado concerto dos Kebra Ethiopia Sound System. Durante a tarde regressarão, após o concerto de ontem