Duas amigas de infância de Riba de Mouro, Monção, lançam obra sobre o "riba-mourês". Reproduzem diálogos e divulgam histórias de vida, tradições, adágios, comidas, saberes, rezas e mezinhas.
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Quando Alda Barreiros, 46 anos, professora de Português, e Maria Alves, 44, contabilista, ambas nascidas na montanha, em Riba de Mouro, Monção, começam a falar "riba-mourês" entre si é preciso um dicionário para traduzir. A conversa faz lembrar a língua galega, cerrada, meio cantada e dominada pela troca do V pelo B, o X e o Tch.
As amigas de infância, que na sua região já são conhecidas por "as de lá de Riba", divertem-se e divertem quem as ouve e lê no blogue "Lá de Riba". Um espaço virtual criado em 2012 para reproduzir conversas e mostrar o quotidiano da aldeia, situada a quase 1400 metros de altitude.
Uma década depois agarraram-se à velha máxima "um velho que morre é uma biblioteca que arde" (lê-se no texto de introdução das autoras), reuniram todo o trabalho de pesquisa que desenvolveram entretanto e escreveram o livro "Os de lá de Riba". A obra já apresentada e esgotada tem cerca de 300 páginas recheadas de histórias de vida, ofícios (Riba de Mouro foi terra de carvoeiros), tradições, adágios, comidas, rezas, mezinhas e diálogos, com palavras e expressões ancestrais, do linguajar das gentes da terra que as viu nascer.
Falar "axim"
"Imos apresentar uma cousa mui bonita", comentaram as duas amigas, que fazem questão de conversar à sua moda entre elas nas redes sociais. E não só. "Nós lá em cima (na aldeia), sempre falamos "axim". Com as nossas mães, com os vizinhos. Os mais velhos ainda falam assim. Nós dizemos que é "riba-mourês"", diz Maria.
"É assim também quando comentamos alguma coisa uma da outra no Facebook e as pessoas dizem que gostam muito de nos ver falar, porque se riem muito", acrescenta Alda, referindo que há dez anos, quando surgiu a ideia de criarem um blogue, o objetivo "era pegar no linguajar, que distingue Riba de Mouro dos outros lugares, porque tradições e costumes todos têm". Entretanto, a iniciativa "começou a ganhar força" e passaram também a divulgar aspetos da vida na montanha e "falas" entre elas.
"Uma vez, estava em casa da minha tia e saí à janela. Estavam duas senhoras, com a minha tia e a avó da Alda, a falar completamente à moda delas. E aí pensei que era engraçado, publicarmos também, de vez em quando, umas conversinhas", recorda Maria Alves.
E assim nasceu o projeto "Lá de Riba", cujo nome tem explicação. "As pessoas da vila de Monção, quando se referem a alguém de Riba de Mouro, dizem "olha, este é lá de Riba". Por ser o nome da terra e por ser lá em riba [na montanha]", indica Alda.
Diálogos
A maioria dos diálogos no livro, que foi apoiado pelo município de Monção e tem prefácio do antropólogo Álvaro Campelo, evidenciam o traço profundamente rural da aldeia. Um dos lugares mais conhecidos de Riba de Mouro é Val de Poldros, para onde a gente se transferia com o gado nos meses de verão. "Fazer o maio" é uma expressão usada pelo povo, que significa a azáfama nos campos. Tirar estrume, cavar, lavrar, semear.
Eis um diálogo: "Andas a proparar, Marquinhas?/ Ó mulhêr, bin estender o esterco, qu"há de tchigar a gente prá labrada e o trabalho xin fazer./ E os arredores, cando os fijeste?/ Os arredores fê-los o Tone, qu"eu nun podia das rêns".
Dicionário
Alçapôn - braguilha das calças dos homens.
Atolembado - tolo.
Bazulaque - gordo.
Beicôn - obrigado(a).
Bico - beijo.
Bizegre - pénis.
Bô galo te cantou! - tiveste sorte.
Bodigo - pão.
Botar a bagada - chorar.
Cantê - que sorte! Quem dera!
Cadrilhar - andar por aí.
Candramalho - pessoa grande, corpulenta.
Comedoiro - comichão.
Dejolhado - com olheiras.
Dó - luto.
Figurôn - homem bonito, elegante.
Feio cm"on pote - muito feio
Foi cagar um arado - diz-se quando alguém foi tratar um assunto e está a demorar.
Lambonada - guloseima
Piteiro - bêbado
Ratcha - pedaço de bacalhau
Reputchona - pessoa que dá más respostas