Estreia esta quinta feira nos cinemas “Banzo”, o filme mais recente de Margarida Cardoso.
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Margarida Cardoso é um dos casos raros de cineastas nacionais que não tem medo de pegar no passado e pôr a descoberto alguns dos seus episódios que, na maior parte do casos, tentamos varrer para debaixo do tapete.
No caso da realizadora, estamos a referir-nos ao período colonial e às suas consequências trágicas, societárias e humanas, expressas também do outro lado da História, a dos povos que oprimimos.
Margarida Cardoso tem evocado esse período sobretudo na sua vertente documental, em obras como “Natal 71” ou “Kuxa Kanema – O Nascimento do Cinema”, não perdendo pois a atenção ao que se passou no período que se seguiu às independências, mas também nas suas ficções, como “A Costa dos Murmúrios”, baseado no romance de Lídia Jorge e um dos mais belos filmes portugueses do início do século.
Continuando o seu percurso nestes territórios, Margarida Cardoso regressa de novo à ficção, com uma obra única pela sua temática e que comprova o seu talento e uma sensibilidade única no panorama do cinema português.
“Banzo”, que hoje estreia em todo o país, passa-se em 1907, numa ilha tropical que poderá facilmente ser identificada como São Tomé, onde chega Afonso, um jovem médico cuja primeira missão será a de curar um grupo de serviçais infetados pela doença que dá o título ao filme, uma nostalgia dos escravizados, longe das suas terras e das suas famílias, e que vão morrendo de inanição ou de suicídio.
Há pois uma evidente oposição entre o poder autoritário, habituado a pensar nestes homens pela sua mera força física, e este médico, confrontado com a “alma” deles, a sua interioridade espiritual, a sua dignidade humana. Essa impotência da personagem interpretada por Carloto Cotta exprime-se pela sua pequena deficiência física, metáfora central de uma obra que explora e interroga de forma subtil o nosso passado.