<p>Queríamos ir para Chefchaouen, embora não soubessemos exactamente porquê. Alguém, amigo de alguém, que disse a alguém, que nos garantiu que valia a pena. A nós, tanto fazia: não tínhamos nenhum plano. A viagem a Marrocos fora decidida dois dias antes, e antes que nos arrependêssemos, decidimos arrancar. Para nos orientarmos tínhamos apenas a nossa vontade de andarmos orientados.</p>
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Desembarque em Tanger, ao final do dia. Um dos taxistas gritou mais alto e foi com ele que fechámos o negócio. Em duas horas chegaríamos.
Foram quatro horas de suplício. O grande negociador não passava dos 40 km/h e recusava-se a baixar o volume da música, que daria para levar Wembley ao rubro. Quanto mais subíamos a montanha, mais isolados estávamos. Noite cerrada e a única luz era a dos faróis do velho, velho não, vamos chamar-lhe experiente, Mercedes. De repente o taxista grita: "Dios mío, que disgracia!". Olhámos para trás. A mala do carro, que tinha todas as mochilas, estava aberta, não sabíamos há quantos quilómetros. Encostada a viatura, sai o motorista. Olha, apalpa (não se via nada) e sentencia: "Tranquilo amigos, no problem". Fecha a mala, faz um xixi e arranca.
Chefchaouen apareceu, finalmente. Objectivo: encontrar a pousada da juventude. Parámos para perguntar a dois jovens. Mal ouviram a questão, começaram aos gritos em árabe com o taxista. Abriram as portas e tentaram forçar a entrada no taxi. Não sabíamos o que fazer. O taxista resolve: "Tranquilo, amigo". Deixámos um entrar. "Vêm comigo, a minha casa, comer, beber e dormir", dizia ele, num castelhano surpreendentemente próximo do de Tony Silva, o da música rrró. Da pousada é que ninguém sabia nada. Insistimos. Meia-hora e muitas voltas depois, os dois lá acederam a levar -nos.
Estava fechada. O dono tinha desaparecido há 6 meses. As janelas partidas. As paredes meio destruídas e cheias de buracos de balas. "Isto faz-me lembrar downtown Beirute, em 1983", ouviu-se no meio do escuro. Obviamente, um exagero.