Biblioteca de Alcântara evoca obra multifacetada de Arlindo Fagundes. Retrospectiva vai da cerâmica à pintura, passando pela ilustração e pela BD.
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Cumprindo a vontade do autor de expor em Lisboa, a Biblioteca de Alcântara - José Dias Coelho recebe a partir de hoje, 15 de Maio, uma retrospectiva da obra de Arlindo Fagundes (1945-2025).
Falecido a 9 de Janeiro último, Fagundes foi um artista multifacetado, que desenvolveu obras em várias disciplinas: cinema, cerâmica, ilustração, pintura, banda desenhada...
A presente mostra, intitulada "Até por mim mesmo já me fiz passar" pretende dar uma visão abrangente do seu percurso longo e multipremiado, apresentando obras de diferentes épocas, desde o seu auto-retrato, anterior ao seu exílio em França, até trabalhos mais recentes na área da pintura.
Inevitavelmente, haverá exemplos do que o tornou mais conhecido do grande público, as ilustrações que desde 1982 fez para a colecção "Uma Aventura", de Isabel Alçada e Ana Maria Magalhães, nomeadamente estudos das personagens e ilustrações menos conhecidas, algumas delas de uma surpreendente minúcia.
Na Biblioteca de Alcântara não faltará também Pitanga, barbeiro de luxo a domicilio, um dos raros heróis da BD nacional, que se estreou em 1985, em "La Chavalita" e viveu movimentadas aventuras ancoradas na realidade e no presente. Para aquele álbum, Fagundes contactou António Variações para que surgisse como colega de trabalho do seu herói, o que o cantor aceitou. Nunca chegou a ver o álbum publicado, por ter falecido prematuramente, mas esta exposição mostra a carta emotiva que Variações escreveu, bem como pranchas e estudos das personagens.
O conjunto agora disponível ao público tem elementos que demonstram o seu gosto confesso pela "bonecada", e o humor, ironia e irreverência que marcaram não só o seu percurso artístico, mas também a sua postura política e social, não faltando por isso algumas das peças mais marcantes do seu percurso enquanto ceramista, como o elefante, o árbitro, a freira ou o padre, exemplos do trabalho que encarava como sendo o de "um artesão" e que, atualmente, se encontram em museus nacionais e estrangeiros.
Fagundes há muito que acarinhava a ideia de expor em Lisboa, desejo agora concretizado pela família e um grupo de amigos, com a "cumplicidade" desde a primeira hora da
curadora Maria Augusta Lima Cruz, sua esposa, e da Biblioteca de Alcântara - José Dias Coelho.
Natural de Ovar, onde nasceu a 3 de julho de 1945, Arlindo Fagundes fez os estudos secundários no Liceu Camões, em Lisboa, e frequentou os cursos de desenho e de pintura da Sociedade Nacional de Belas Artes, onde foi admitido em 1965.
Dois anos depois, por razões políticas, foi forçado a exilar-se em França, onde se diplonou como realizador de cinema no Conservatoire Libre du Cinéma Français.
Regressado a Portugal após o 25 de abril de 1974, realizou três curtas-metragens para os estúdios do Porto da RTP, fixando-se de seguida em Braga, onde reactivou a Olaria Ágata na Vila de Prado (Vila Verde). Foi também professor e formador nas áreas de fotografia, artes gráficas, cerâmica e comunicação desde 1978, em várias escolas, destacando-se a Escola Calouste Gulbenkian e a Escola Profissional de Braga.
A exposição abre hoje às 18h00h, com algumas palavras da curadora Maria Augusta Lima Cruz, investigadora e professora aposentada da Universidade do Minho, especializada na expansão portuguesa na Ásia e no Norte de África entre os séculos XV e XVII, e de António Durães, actor, encenador e um dos fundadores do Sindicato de Poesia, em Braga. Amanhã, 16 de Maio, às 11h, terá lugar uma visita guiada por Maria Augusta Lima Cruz.
A mostra encerrará a 14 de junho, dia em que, às 17 h, terá lugar uma sessão sobre o ilustrador e autor de BD, com a participação de Ana Maria Magalhães e Isabel Alçada, autoras da colecção "Uma Aventura", e Maria José Pereira, editora de banda desenhada, com moderação de Zeferino Coelho, responsável da Editorial Caminho.