“To all trains” é o provável adeus de Shellac, banda liderada por Steve Albini que viveu plenamente a sua visão musical.
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É um inesperado epitáfio para os campeões do math rock. “To all trains” deveria ser, apenas, o sexto álbum de estúdio de Shellac, mais uma caderneta de cromos estridentes, descompassados e minimais. Infelizmente, tornou-se, quase de certeza, o último, com o falecimento súbito do vocalista Steve Albini, aos 61 anos, dez dias antes do lançamento do álbum, a 7 de maio.
A falta de Shellac foi já sentida no último Primavera Sound, onde funcionavam como espécie de patronos – a banda esteve presente em todas as edições do festival, no Porto e em Barcelona. Uma Listening Party, onde se escutou “To all trains”, foi a forma encontrada para homenagear o grupo americano fundado em 1992 por Bob Weston (baixo), Todd Trainer (bateria) e Steve Albini, cantor e guitarrista que se tornou célebre como produtor de Nirvana, Pixies ou PJ Harvey.
Foi banda que viveu plenamente a sua visão própria da música, sem concessões, sem prazos de entrega, fiel apenas à missão de construir canções intensas, concisas e angulosas, desde a estreia – “At action park” (1994) – até à obra, aparentemente, final. Nesse aspeto, “To all trains” servirá, como qualquer outro disco de Shellac, como documento de uma aventura inteiramente “indie” – da criação à produção.
Dura apenas 28 minutos esta coleção de 10 faixas povoadas de letras crípticas e cáusticas, com referências ao karaoke, a bandas femininas de new wave ou ao rato insuflável usado em protestos sindicais nos EUA (“Scabby the rat”). E como há coisas do camandro, na última faixa, “I don´t fear hell”, surgem estas linhas premonitórias: “And if there’s a heaven, I hope they’re havin’ fun, ’cause if there’s a hell I’m gonna know everyone.”
Fica o registo de uma banda a que a Pitchfork chamou de “Honda Civic do rock alternativo: modesta, confiável, genericamente acessível.”