Novo filme de Edgar Pêra usa inteligência artificial para reinventar as vidas do poeta Fernando Pessoa e do escritor de ficção científica H. P. Lovecraft.
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Um dos cineastas mais imprevisíveis, experimentais e fascinantes do cinema português, Edgar Pêra propõe agora uma obra cujas imagens foram integralmente produzidas com recurso a programa de inteligência artificial, “Cartas telepáticas”.
Com uma filmografia sempre em movimento, o realizador já experimentou ao longo das últimas três décadas os mais variados formatos e artifícios que o cinema lhe proporciona, nomeadamente o 3D, tendo contribuído para um filme coletivo com essa tecnologia, que incluía ainda episódios de Peter Greenaway e Jean-Luc Godard.
A inteligência artificial é o novo brinquedo de Edgar Pêra, assim escrito sem quaisquer reticências, literais ou metafóricas, já que é esse também um termo que o próprio realizador não renega no seu trabalho quotidiano.
Na verdade, a metodologia de produção de um filme muda por completo com a nova ferramenta, com o realizador a trocar o uso de câmaras de filmar pelo teclado do computador ou, ainda mais espantoso, do seu telemóvel!
Para esta primeira grande digressão pelo mundo da I. A. aplicada ao cinema, Pêra não podia ter escolhido melhor tema do que uma hipotética correspondência entre o poeta português Fernando Pessoa e o norte-americano H. P. Lovecraft, notável criador de "weird fiction", com incursões na ficção científica, fantasia e terror. Os dois escritores são verdadeiras obsessões para o realizador português.
Em “Cartas telepáticas”, que chega às salas de cinema esta quinta-feira com as vozes de Keith Davis, Iris Cayatte, Bárbara Lagido e Victoria Guerra, configura-se a hipótese, meramente ficcional, de que Pessoa e Lovecraft se corresponderam, já que viveram na mesma época e partilharam, no seu percurso de vida e de morte, algumas estranhas e impensáveis conexões.
O resultado, surpreendente e arrebatador, é uma viagem pelas mentes dos dois escritores, pelos seus universos, personagens ou projeções, pelos seus sonhos e pesadelos, ordenada a uma máquina pelo “operador” Edgar Pêra, para seu e nosso prazer.
Nunca tínhamos visto nada assim. É o advento de um novo cinema que se desenha perante os nossos sentidos.