Um dos maiores bateristas da história do rock morreu aos 80 anos. Era o mais discreto de The Rolling Stones, criando um som inconfundível sem nunca se afastar do amor ao jazz.
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Charlie Watts, baterista de The Rolling Stones desde 1963, faleceu hoje num hospital de Londres, afirmou o seu assessor de imprensa em comunicado. O músico, de 80 anos, partiu "rodeado pela sua família". Watts era um "marido, pai e avô querido" e "um dos maiores bateristas da sua geração", prossegue o comunicado.
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No início de agosto havia sido anunciado que o músico falharia, pela primeira vez, uma digressão da sua banda de sempre. Uma tour marcada para os Estados Unidos, 13 datas entre setembro e dezembro, em que Watts não participaria para recuperar de uma intervenção médica não revelada. "Por uma vez, o meu timing tem sido um pouco errado", afirmou na altura.
As reações ao falecimento chegaram rapidamente. Ringo Starr tuitou, "Deus abençoe Charlie Watts vamos sentir a tua falta paz e amor para a família". Também no Twitter, Elton John afirmou tratar-se de "um dia muito triste. Charlie Watts era o melhor baterista. O mais elegante dos homens e uma companhia brilhante. As minhas mais profundas condolências a Shirley [esposa], Seraphina [filha] e Charlotte [neta]. E, claro, a The Rolling Stones". A mesma rede social serviu para Nile Rodgers afirmar: "És um companheiro suave. Obrigado por toda a excelente música".
Um gentleman do rock
Charles Robert Watts nasceu a 2 de junho de 1941 numa Londres ferida pela Segunda Guerra Mundial. À semelhança de muitos contemporâneos que haveriam de singrar na música, uma das suas obsessões na infância consistia em escutar discos de jazz e blues vindos da América. Um duplo eixo de que não se afastou ao longo da vida. A opção pela bateria chegou na adolescência, começando a atuar no circuito de pubs do norte da capital britânica como membro do Jo Jones Seven. Em 1961 transferiu-se para os Blues Incorporated, de Alexis Korner, onde conheceu o guitarrista Brian Jones, que lhe abriu o caminho para o ingresso em The Rolling Stones dois anos mais tarde. Em 64 casou-se com Shirley Ann Shepherd, uma união que resistiu, num admirável contraciclo, a mais de meio século a bordo da banda rock mais popular do planeta.
Em parelha com o baixo de Bill Wyman, Watts construiu o leito rítmico inconfundível dos Stones, um eixo dinâmico e não impositivo, aberto a inovações sobretudo no final dos anos 1970, com a introdução de influências do funk e do disco. O som da sua bateria, aparentemente simples, funcional, é uma peça tão incontornável da história da música popular como a voz de Mick Jagger e as guitarras de Keith Richards, Brian Jones, Mick Taylor e Ron Wood.
A marca musical do baterista está longe de se restringir a The Rolling Stones. Com The Charlie Watts Orchestra e The Charlie Watts Quintet, aprofundou o amor pelo jazz, dando em simultâneo ampla visibilidade (e trabalho) a um rol de importantes músicos da história do jazz britânico. Os fatos que adquiria nos alfaiates de Savile Row ajudaram a fazer dele um singular gentleman do rock.
Um soco na imagem pública
A história lê-se em "Life", a autobiografia de Keith Richards publicada em 2010, embora já tivesse sido contada diversas vezes antes disso. É uma narrativa que, por uma vez, contraria a imagem de reserva lacónica e pacífica criada em redor de Charlie Watts. Em meados dos anos 1980, no período de maior desgaste e atrito entre os cinco The Rolling Stones, que coincidiu com o único momento em que Watts admite ter-se deixado vencer pelo consumo de drogas duras, o músico perdeu as estribeiras quando Mick Jagger telefonou para o seu quarto de hotel, solicitando a comparência do "meu baterista". Charlie Watts ter-se-á barbeado e vestido um fato, dirigindo-se para os aposentos de Jagger, onde aplicou um soco no rosto do vocalista e compositor, disse "Nunca mais voltes a chamar-me o teu baterista. Tu és a porra do meu cantor!", e foi-se embora. Calmamente.