São 50 anos a escrever sobre cinema. Na passagem para a realização, o trabalho mais importante, "Manhã Submersa", completa agora 30 anos. A hora é de festa para o realizador, crítico, divulgador e promotor de festivais Lauro António.
Se considerarmos que o cinema tem pouco mais de 100 anos de existência, é obra passar quase metade desse tempo a divulgá-lo.
Através da escrita, da programação de salas e organização de festivais, do ensino, enfim, passando da teoria à prática. É o que tem feito Lauro António, desde há exactamente 50 anos.
Aproveitando o facto de "Manhã Submersa", o mais importante título da filmografia de Lauro António, completar neste mês de Outubro trinta anos desde a sua estreia, o Teatro da Trindade inaugura hoje, terça-feira, uma exposição e uma retrospectiva do trabalho do cineasta, a mais completa até hoje organizada, incluindo o trabalho que também fez para televisão.
Nascido em Lisboa, a 18 de Agosto de 1942, Lauro António tirou o curso de História. Foi membro do Cine-Clube Universitário de Lisboa e do ABC Cine-Clube, verdadeiras "escolas de cinema" da época, numa altura em que a Cinemateca tinha uma actividade muito limitada, a televisão não exibia muitos filmes e não existiam os chamados cinemas de arte e ensaio.
Do cine-clubismo para a escrita foi um passo, com a passagem por inúmeros jornais, revistas - foi director de "Isto é Espectáculo" e "Isto é Cinema" - programas de rádio e de televisão. Foi aliás após algumas temporadas a apresentar filmes na TVI que Herman José criou um "boneco" por si inspirado, o Lauro Dérmio, acentuando-se a sua peculiar pronúncia inglesa, na frase que ficou famosa: "let"s look at the traila"!
Conseguindo realizar o sonho de muita gente que escreve sobre cinema mas nunca teve coragem de o fazer, Lauro António passou à realização, no final da década de 70. As duas curtas-metragens "Prefácio a Vergílio Ferreira" e "Vamos ao Nimas" foram mesmo o balão de ensaio para a obra maior de Lauro António, "Manhã Submersa".
O filme, estreado em 1980, chegou ao mesmo tempo que outros títulos que almejavam também uma relação mais "pacífica" com o espectador comum, como "Cerromaior", de Luís Filipe Rocha, "A Culpa", de António Victorino d"Almeida" ou "Oxalá", de António-Pedro Vasconcelos. Um dos momentos altos, dos muitos altos e baixos que o cinema português tem vivido.
Lauro António seguiu carreira. Fez uma série de quatro "Histórias de Mulheres", para a RTP, e mais uma longa-metragem, "O vestido cor de fogo". Um projecto não realizado sobre Florbela Espanca ter-lhe-á retirado a vontade de fazer mais cinema. Mas tem continuado, de novo deste lado. No ensino universitário, na organização de festivais de cinema (Seia, Famalicão, Viana do Castelo) onde nem sempre o bom cinema chega.
A partir de hoje, com a exibição ao fim da tarde de curtas-metragens, e à noite de "Manhã Submersa", é a hora de recordar o seu contributo. Que a sua paixão, perseverança, independência e não alinhamento sirvam de exemplo.
