<strong>Documentário na RTP Play conta as glórias e desastres do maior estúdio de cinema europeu.</strong>
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Serviu o fascismo e a democracia, libertou mentes e manipulou-as. Fez retratos falseados e realistas do Mundo. Teve glamour e foi bombardeado. O maior estúdio de cinema europeu, a Cinecittà, entrelaçou-se com a história conturbada da Itália do século XX e é um dos seus documentos mais sensíveis. A obra de Emmanuelle Nobécourt, disponível na RTP Play, capta o período mais fragoroso, entre a inauguração e "La dolce vita".
"Para que a Itália fascista espalhe a luz da civilização romana pelo Mundo" foi um dos motes para a construção do complexo com 73 edifícios (14 estúdios de filmagem) implantados num terreno de 60 hectares na periferia de Roma. Sob o alto patrocínio do Duce, a Cinecittà inaugurou em 1937, e a sua primeira produção, "Cipião, o africano", de Carmine Gallone, revelava os propósitos da empreitada: um épico com 10 mil figurantes, 2 mil cavaleiros e 30 elefantes que relacionava a expansão africana do império romano com a aventura colonialista de Mussolini, que invadira a Etiópia, em 1935, numa ofensiva brutal que incluiu a utilização de armas químicas.
Uma Itália de acordo com os padrões do regime foi sendo fabricada na Cinecittà, ao mesmo tempo que emergia, longe dos estúdios, um cinema que abordava todos os tabus: pobreza, desemprego, adultério, prostituição. Primeiro com Visconti, "Obsessão" (1943), filme que lança as bases do neorrealismo, e já no final da guerra, em 1945, com "Roma, cidade aberta", de Rossellini, obra que desloca a perceção ocidental sobre a Itália, de país carrasco para vítima. Este movimento assiste ao colapso do regime e da Cinecittà, que servirá de lugar de acolhimento para refugiados entre 1945/47.
Segue-se a fase da influência dos EUA, que financiam o ressurgimento do complexo num país dividido sobre a posição a tomar no contexto da Guerra Fria. As estrelas de Hollywood e o "milagre económico" geram um novo ambiente na capital, com epicentro na Via Veneto - lugar recriado em estúdio por Fellini com "La dolce vita", que capta o brilho e as armadilhas de um país em busca de uma identidade. Toda essa história passou - e foi processada - na Cinecittà.
"Cinecittà: A fazer história"
2021
Emmanuelle Nobécourt
RTP Play