Coreógrafa fez uma peça por ano, a cada dia da semana um novo tema e um novo convidado.
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Em 2011, "num gesto político", a coreógrafa Cláudia Dias decide encetar um projeto para terminar com a sua carreira. A este mapeamento chama-lhe "Sete anos, sete peças", que vai ser apresentado nos espaços do Teatro Campo Alegre, no Porto, num ciclo integral, a partir de segunda-feira. O projeto ganhou os prémios BPI/La Caixa Solidário e o PARTIS da Gulbenkian.
Ao JN conta que "a narrativa de inexistência de futuro no setor das artes, em que ter um ano é ser privilegiado", foi o que a motivou "a ir contra essa corrente e dizer que temos alternativa, porque um ano é de uma precariedade absoluta". E decidiu avançar com um plano a dez anos.
Apesar de várias pessoas a tentarem demover nesta ousadia, assegurando-lhe que "estava doida e não iria conseguir", lançou a provocação a estruturas e autarquias. O antigo executivo da Autarquia de Almada disse logo que sim, em sete anos e sete escolas. (Em 2018, o projeto das escolas também foi integrado pela cidade do Porto).
Das estruturas, o Festival Alkantara foi o primeiro a assinar o contrato de cruz, porque o ciclo não passava de um plano, "num ato generoso e bonito, bem como o Rivoli (Teatro Municipal do Porto)". A estas instituições juntaram-se também o Espaço do Tempo e o Teatro Maria de Matos.
Novos encontros
Depois de um percurso pautado pelo trabalho a solo, que lhe possibilitou "ir muito a fundo no universo, tinha um desejo de encontro com o outro, encontros com outras práticas e outros artistas", explica.
Se no início partiu com muitas certezas, sobre as pessoas com que queria trabalhar (atualmente tem uma equipa de doze pessoas) e os interesses que tinha, ao longo do tempo, foi mudando.
Por exemplo, "tinha uma curiosidade real com o Igor Gandra (diretor do Teatro de Ferro e do Festival Internacional de Marionetas do Porto) e houve território para essa curiosidade se materializar. Com a Idoia Zabaleta, com quem fiz vários projetos no País Basco, já a conhecia e havia um grande respeito mútuo. Com o Luca Bellezze havia uma curiosidade, como aluno, em unir os dois mundos". Cada um destes artistas de distintas áreas foi convidado para um dia da semana.
Mas existiram outros que originalmente estiveram na lista e com os quais não trabalhou. "Num projeto, se estás numa prisão não é interessante", comenta.
Liberdade artística
Em todos os projetos fez um mergulho, com um olhar político. "Segunda-feira, um olhar sobre a Europa na altura, securitárias, não humanistas, com posturas neocolonialistas em relação aos PIGS (Portugal, Itália, Grécia e Espanha). Terça-feira "um conta-contos sobre a história de um menino palestiniano chamado Omar entre o Líbano-Palestina e Itália". Quarta-feira chega com o "neoliberalismo, a catástrofe e a morte". Quinta-feira, a "palavra como mobilizadora para a ação coletiva". Sexta-feira assume o papel de oráculo do século XXI e faz "cinco visões de futuro, sobre mudanças climáticas, com uma crítica às Gretas Thunberg deste Mundo". O fim de semana chega e o tempo é de leitura e arquivo sobre o caminho percorrido.