Mais um dia, mais 12 pequenos concertos para animar quem está em quarentena face à epidemia do Covid-19.
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A partir das suas casas para o mundo inteiro, O Gajo, Joana Almeida, Luís Severo, Rui Massena, Carolina Deslandes, The Legendary Tigerman e Ana Bacalhau, entre outros artistas, tocam a sua música em concertos de meia hora como forma de incentivar a população a ficar nas suas casas e tornar estas situações de isolamento social mais "suportáveis", para além de manter ativa a indústria cultural num momento em que esta se vê ameaçada pelo cancelamento e adiamento de concertos e festivais.
O Gajo
Aproveitando o palco virtual aquecido anteriormente por Valas, O Gajo toma as rédeas do festival pelas 17h30, com o seu ar muito peculiar e de viola campaniça em mãos. "Façam como se estivessem em vossa casa", brinca.
Após uma breve introdução, ouviu-se "Rua da felicidade", "Varredor" e "O cego e a guitarra". O som tão caraterístico da viola campaniça, misturado com as reflexões que O Gajo ia fazendo, transportaram a audiência, ainda que através de uma rede social e dentro das suas cabeças, para outros mundos, levando o mote deste festival a um outro nível: permitir a quem se encontra em isolamento social viajar, sem sair das suas casas. Seguiu-se, assim, "Cidade oculta" e uma homenagem à mais velha carteirista do país, uma figura popular que, uma vez que conta com 81 anos de idade, O Gajo brinca "merece homenagem, uma vez que é grupo de risco e no entanto continua a exercer a sua atividade".
O Gajo despediu-se ainda com um convidado especial, o seu filho, que leu "O capitão", um poema de Jesús Lizano, celebrando o facto de hoje ser o Dia da Poesia.
Luís Severo
"A setlist só incluirá canções sobre esperança, ou sobre o apocalipse", avisava Luís Severo no seu instagram horas antes do início do seu concerto. Ao teclado e desde o seu sofá, parecendo uma reencarnação dum jovem Steve Jobs, Severo deu meia hora da sua vida para animar quem se encontra em casa em isolamento social e promover esta medida de contenção.
A sonoridade calma e quase zen de Luís Severo sentiu-se ao longo de todo o concerto, que começou com "Domingo", "Planície (Tudo igual)" e "Rapaz". Mantendo a austeridade nas palavras, o artista seguiu para "Primavera", um tema que parece exprimir o que todos pensam neste momento: na Primavera e em sair à rua em normalidade. "Acácia", "Santo António" e "Quem me espera" vieram de seguida, novamente sem qualquer tipo de comentário ou menção por entre canções. Ouvimos ainda "Amor e verdade", que Tomás Wallenstein tinha já interpretado neste festival. Antes de se despedir, o artista justificou o seu aparente silêncio com a curta duração do concerto e concluiu com "Maio" e "Lábios de vinho".
Rui Massena
De copo de vinho na mão, sentado ao piano e brindando "à saúde de ver este tempo como uma oportunidade", Rui Massena pôs o seu génio musical a trabalhar e as suas mãos a fazer cócegas no marfim, marcando um dos momentos altos destes cinco dias de festival com uma lição de virtuosismo.
"D-Day" abriu o concerto, marcando desde logo o contexto de enfrentamento em que nos encontramos, numa guerra não contra um inimigo físico, mas contra um invisível, sem cores, nem bandeiras, nem ideologias. "Nós" veio a continuação, junto com "Família". As doces melodias de Massena, em conjunto com o repentino apagar de luzes no seu estúdio, fez com que bastasse fechar os olhos para entrar num momento de auto-reflexão, de intensa procura por respostas perante a crise que enfrentamos. Assim o afirmavam os milhares de espetadores através de mensagens enviadas em direto. Em estado quase de transe, e deixando mensagens positivas e de força à audiência virtual, seguiu-se "aBem", "The Tree" e "Amanhecer".
Meia hora passou mais rápido que o que gostaríamos, e o maestro começou a sua despedida com votos de felicidade e uma mensagem inspiracional, antes de concluir com "Estrada", tema baseado num poema de Alberto Caeiro, "Para além da curva da estrada".
Carolina Deslandes
No seu estilo mais natural e íntimo, a partir da sua sala e acompanhada pela família, Carolina Deslandes recebeu os mais de 20 mil espetadores dizendo que "isto é como se eu estivesse a receber os meus amigos todos em casa", em referência aos vários amigos e colegas de profissão que se iam fazendo sentir através do chat da transmissão.
Acompanhada pelo seu marido Diogo Clemente na guitarra, Carolina Deslandes partiu para "A miúda gosta", "Inquieta" e "Aleluia", temas do seu próximo disco. Seguiu-se "Avião de papel", um tema que a artista confessa foi escrita inicialmente para Sara Tavares, mas que esta "devolveu". "Foi o amor", single de Diogo Clemente, seguiu-se, com um momento a solo do artista, e, em forma de despedida, Carolina Deslandes retornou para cantar um dos seus temas mais conhecidos, "A vida toda".
The Legendary Tigerman
Depois do fado, do Hip Hop, do pop, do indie, chega o Rock and Roll de The Legendary Tigerman, que se apresenta num ambiente... algo pouco ortodoxo, com muitos LEDs coloridos e uma intrigante figura animalesca, um "tigerman", ao seu lado.
À medida que as pessoas migravam para o seu direto, ouviu-se "Love Ride", que ia aquecendo os motores para o que viria a seguir. "Life ain"t enough for you", do álbum Femina, ouviu-se de seguida, junto com "A girl called home" e um cover de "Me and the devil blues", de Robert Johnson. O concerto prosseguiu com o típico estilo reservado de Paulo Furtado, deixando o poder da sua música transmitir a sua mensagem de apoio a quem mais o precisa na atual crise que o país vive. "Twenty flight rock", original de Eddie Cochran, foi o tema dedicado "para dançar".
No âmbito do apelo para ficar em casa, foi quase inspirador ouvir "Do come home" e, para concluir, dedicando a canção a um casal de amigos que tiveram um filho recentemente, The Legendary Tigerman despediu-se com "Walking Downtown".
Ana Bacalhau
O concerto de Bacalhau iniciou sem Leitão - José Pedro Leitão, isto é -, que não se conseguiu juntar ao concerto, com uma música da banda sonora da série "1986" de Nuno Markl, "Pensamos no futuro amanhã", seguida de "Leve como uma pena" em a cappella, e, após uma breve interação com os amigos e colegas que Ana Bacalhau ia reconhecendo no chat, "Seja Agora".
Após algumas palavras de força a quem trabalha em serviços médicos e de produção de bens essenciais, e dum quase-insulto a quem não cumpre as recomendações de ficar em casa, Ana Bacalhau cantou o tema "Erro mais bonito", que canta, habitualmente, com Diogo Piçarra.
Um ligeiro nervosismo e uma constante interação com o público marcaram o concerto de Ana Bacalhau, que se despediu com dois covers, um de "Khawuleza", um tema original de Miriam Makeba sobre a dor e o sofrimento dos tempos do apartheid, e "We shall overcome", de Pete Seeger.
A noite findou com o DJ set de Moullinex, tendo este quinto dia de festival trazido ainda mais música para animar e motivar aqueles que se encontram em isolamento social como medida de contenção perante a Covid-19. Amanhã é o último dia do festival, contando com nomes como Luísa Sobral e Tiago Bettencourt