O Centro Cultural de Belém (CCB) vai abrir dois concursos internacionais para os cargos de Direção Artística de Artes Performativas e Curadoria do Centro de Arquitetura do MAC/CCB. À primeira vista, uma medida alinhada com os princípios da transparência e do mérito.
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Como sempre, o diabo está nos detalhes – e nos telefonemas feitos à última hora. Aida Tavares foi demitida no último dia do Governo. Foi pelas 17 horas desta quarta-feira, no preciso dia em que o novo elenco governativo era anunciado e a ministra da Cultura, Dalila Rodrigues, já sabia que estava de saída, que Aida Tavares, diretora artística da unidade de Artes Performativas e Pensamento do CCB, recebeu um telefonema. Do outro lado da linha, Nuno Vassallo e Silva, presidente do CCB, e a vogal Madalena Reis comunicaram-lhe que o seu lugar ia a concurso. “Confirma-se que fui demitida por telefone”, disse Aida Tavares ao "Expresso". Ao "Observador", foi ainda mais clara: “Tem significado político. É uma demissão à 25.ª hora da senhora ministra”.
A decisão, que o CCB se apressou a apresentar como um reforço da legitimidade e da internacionalização da programação artística, é, na leitura de muitos, o mais recente episódio de uma novela política-cultural que tem como palco o CCB e como protagonistas as tensões entre os últimos dois governos.
Recorde-se que Aida Tavares assumiu o cargo em dezembro de 2023, numa contratação direta feita por Francisca Carneiro Fernandes, então presidente do CCB e figura nomeada por Pedro Adão e Silva, último ministro da Cultura do Governo PS. Menos de um ano depois, tanto Tavares como Fernandes estão fora. A primeira, por telefone. A segunda, exonerada em novembro por Dalila Rodrigues no último dia útil do prazo que lhe permitia afastar quadros de nomeação política sem justificação formal.
Do lado do CCB, Nuno Vassallo e Silva, nomeado já sob a tutela de Dalila Rodrigues, garante que Aida Tavares “não foi despedida nem afastada”, apenas informada da abertura de um concurso para legitimar o cargo que ocupa. Mas essa argumentação soa fraca, sobretudo tendo em conta que o contrato de Tavares era de quatro anos. “Ainda vão gastar dinheiro ao CCB”, comentou a programadora, referindo-se à indemnização que, em princípio, terá de ser paga.
A polémica em torno da legitimidade das nomeações para cargos de direção no CCB não é nova. Em audições parlamentares no início do ano, a então ministra Dalila Rodrigues acusou o seu antecessor, Pedro Adão e Silva, de “assalto ao poder” no CCB, garantindo que com ela “acabavam os compadrios”. Pedro Adão e Silva respondeu com ironia: “Quem diz é quem é”.
Mariana Pestana, atual curadora do Centro de Arquitetura do MAC/CCB, vai também abandonar o cargo, desta vez a seu pedido. A arquiteta foi selecionada em concurso internacional aberto em junho de 2023 e iniciou funções em março de 2024. Agora, o lugar volta a ser posto a concurso, num processo semelhante ao que será lançado para a Direção Artística das Artes Performativas.
A partir de sexta-feira, as candidaturas aos dois concursos poderão ser consultadas no site do CCB e estarão abertas por dois meses. A instituição sublinha que pretende “reforçar o seu posicionamento central na promoção das artes” durante o triénio 2025-2027.
No fundo, a história repete-se: novos governos, novas direções, novas versões da mesma ideia de “refundação”. Mas refundar o quê, exatamente é a pergunta que fica por responder.
Comissão de Trabalhadores do CCB demite-se
A Comissão de Trabalhadores da Fundação CCB apresentou hoje a demissão, considerando ter havido uma “quebra irreversível de confiança” na atual administração e na tutela, remetendo para uma série de acontecimentos “dos últimos sete meses”.