"Pacifiction", do espanhol Albert Serra, teve participação da Rosa Filmes.
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A edição de 2022 do Festival de Cannes já tivera o primeiro realizador português, Tiago Guedes, a estar presente na Secção Oficial do festival desde que Pedro Costa por aqui passara há 16 anos com "Juventude em marcha" quando, há alguns dias, como aqui relatámos, fora apresentado, numa sessão especial, "Restos do vento".
Ontem foi a vez de uma coprodução portuguesa, "Pacifiction", de Albert Serra, com participação da Rosa Filmes de Joaquim Sapinho, se apresentar mesmo a concurso. Será que no próximo sábado teremos uma das mais belas surpresas do cinema português? O filme de Serra já fora apresentado em Paris, à imprensa francesa, e vinha rodeado da aura de potencial candidato à Palma de Ouro.
Com o francês Benoit Magimel como protagonista e uma curiosa presença enquanto ator do curador e crítico de arte Alexandre Melo, "Pacifiction" é seguramente um objeto estranho na competição, podendo notar-se pela diferença, mas também pela radicalidade.
Sem perder o estilo minimalista presente em filmes como "A morte de Luís XIV" ou "Honra de cavalaria", "História da minha morte" ou "Liberté", o catalão surge desta vez com o que pode ainda assim ser considerado o seu filme mais narrativo, levando-nos numa viagem até à Polinésia Francesa.
É aí que chega um representante do governo francês que, numa altura em que se fala na possibilidade de novos testes nucleares na região, se vai confrontar com a resistência local a tais atos. Uma viagem a um local exótico e pouco filmado, nos antípodas no entanto do bilhete-postal e com alguns momentos de forte inspiração, que nos embala de forma quase hipnótica.
O dia de ontem, o mais carregado no que diz respeito a obras em competição, trouxe também os últimos filmes de Koreeda Hirokazu e Lukas Dhont. O japonês, que já venceu a Palma de Ouro com "Shoplifters - Uma família de pequenos ladrões", volta a Cannes com "Broker" ou, na tradução literal do título francês, "As boas estrelas". O filme parte de uma base dramática poderosa.
Uma associação coloca uma caixa, tipo multibanco, onde mulheres que tenham dado à luz bebés indesejáveis os podem deixar. É isso que faz a protagonista que, no entanto, se arrepende, acompanhando depois o processo de venda ilegal do bebé a pais que desejem adotar fora do circuito oficial. Um périplo por vários locais da Coreia do Sul, onde se desenrola a ação, acompanhado à distância por uma equipa da polícia.
O filme deixou toda a gente um pouco indiferente, pela ausência de uma força narrativa que nos faça interagir com a protagonista. O mesmo já não se pode dizer de "Close", do belga Lukas Dhont, que em 2018 vencera a Caméra d"Or para melhor primeira obra e o Prémio da Crítica com "Girl". Agora volta a emocionar-nos, e de que maneira, com a história de dois adolescentes de 13 anos, há muito os melhores amigos, que chegam a uma nova escola, ao mudar de ciclo educativo. Só que enquanto Léo começa a misturar-se com outros colegas, Rémi não consegue aguentar o que enfrenta como uma rejeição, acabando por tomar uma decisão trágica. Retrato sensível de um momento na vida de dois adolescentes onde a sexualidade começa a revelar-se, sobre a perda, sobre os limites da amizade e do amor, "Close" pode ser o elo que faltava numa competição de assinalável qualidade média, mas ainda sem aquele "coup de coeur" por que sempre se espera. Teremos estado na presença da Palma de Ouro da edição 75 do Festival de Cannes. Para saber já ao fim da tarde do próximo sábado.