Nova criação da artista tem estreia absoluta este sábado, no Auditório de Serralves, no Porto, e repete domingo, no âmbito do Festival DDD - Dias Da Dança.
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Quando cortamos a cebola choramos por causa da cebola ou quando temos vontade de chorar cortamos cebolas para nos justificar? A coreógrafa Inês Campos é, ela própria, uma espécie de cebola com todas as camadas que lhe vamos descobrindo. A sua capacidade vocal e musical já era há muito conhecida pelo desempenho em projetos como o grupo Sopa de Pedra e é exatamente com essa valência de canto de sereia que nos arrasta para o seu novo espetáculo “Fio ^”, em estreia absoluta no Festival DDD este sábado.
A récita é às 17 horas, no Auditório de Serralves, no Porto, e repete no domingo, à mesma hora.
Escrever canções como ato terapêutico será corriqueiro, mas nas suas letras a artista consegue ser muito mais profunda do que qualquer música de desamor – porque nos ataca com perguntas existenciais.
Como quando alguém nos adverte para uma evidência e a partir desse momento vivemos condenados a pensar nela, como se fossemos submetidos a um inquisidor de três anos que nos pergunta por que sopra o vento, ou por que morrem as pessoas. Uma ordem aleatória de importância para a curiosidade do perguntador, não a mesma ordem de grandeza emocional para quem responde.
A somar a estas camadas, Inês Campos é também designer, o que a faz ter grande acuidade visual – a rapariga de sapatos vermelhos brilhantes que passeia um crocodilo deixa-nos uma série de mensagens com a semiótica a pairar.
O seu domínio da cena a solo, o seu teatro de objetos, a articulação de corpo e voz e a sua vulnerabilidade transformam o espetáculo “Fio ^” num dos mais interessantes do Festival Dias Da Dança. Inês Campos consegue mostrar-se uma artista completa neste solo, com a mais-valia de ter contado com Regina Guimarães na sua equipa.
As palavras da poetisa têm a mesma capacidade das cebolas: não sabemos se choramos porque as ouvimos, ou se ao ouvi-las são uma caixa de ressonância da nossa dor.