"Darktraces: on ghosts and spectral dances"", de Joana Castro, investiga os movimentos entre o visível e o invisível. Em cena este sábado e domingo no auditório da Fundação de Serralves, no Porto, como parte do programa do DDD - Festival Dias da Dança
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"Quando testemunhamos ou experimentamos o corpo a mover-se assistimos também ao desaparecimento desse movimento - e a marca que fica é a memória nos corpos que o observaram ou executaram." É desses rastos, indícios e espetros que trata "Darktraces: on ghosts and spectral dances", coreografia de Joana Castro que sobe este sábado e domingo ao palco do auditório da Fundação de Serralves, no Porto, no âmbito do DDD - Festival Dias da Dança.
Surgido na sequência de "Rite of decay", solo estreado no Festival GUIdance, em Guimarães, 2020, que lidava com o tema da morte e do fim "como potência transformadora e regeneradora", "Darktraces" desloca essa temática para a relação com o tempo, explica ao JN a coreógrafa: "A nossa memória tem origem no passado, mas é vivida no presente e é também um fantasma no futuro, porque projetamos a nossa experiência nesse devir, e interessa-me perceber como reformulamos o nosso presente para caminharmos em direção ao futuro projetado. Quis explorar essa ideia de um passado transversal ao tempo."
Palavra-chave para entender o espetáculo é "fantasma", algo para lá da vida e da morte e que desfaz dicotomias como "material/imaterial, visível/oculto, presença/ausência", relacionando-se com a própria arte: "O artista tem o poder de tornar visível o invisível e de questionar o ser ou não ser, o vivo ou o morto, porque há toda uma possibilidade de divagar a partir de indícios, de seguir intuições, e não apenas a perceção imediata das coisas."
Para materializar "fantasmas" em palco, ou deixar-nos intuí-los, Joana Castro sentiu necessidade de sair de cena, "sair do corpo", e confiar a performance a quatro intérpretes que carregassem as suas próprias fantasmagorias: "Quis perceber como é que o meu universo artístico e autobiográfico podia dialogar com outros universos individuais e criativos e, ao reverso, como é que estas quatro identidades, que têm também as suas assombrações, os seus traumas, as suas questões existenciais e a sua memória ancestral, porque provêm de diversas geografias, se podiam relacionar com a minha vida pessoal e a minha experiência artística."
Um bom exemplo do que se tentou fazer encontra-se no papel da luz e do som, que "não vivem apenas da ação e daquilo que é visível, são objetos independentes, têm a sua própria ação." "Darktraces" é um convite a utilizar outros sentidos, a recorrer a outras formas de perceção, "a não ficarmos agarrados ao que é visível", resume a criadora.