Alguma da mais interessante música nova que se tem feito em França passa por aqui. A maior parte são músicos ainda longe dos holofotes da fama, muitas vezes conhecidos apenas por uma minoria mais atenta ao que por ali se vai fazendo.
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Um dos mais promissores parece ser Baptiste W. Hamon, um cantor de 29 anos que só lançará o seu primeiro álbum em março mas que já deixou óptimas pistas nas canções dos seus EPs. Nas primeiras audições poderá sentir-se o fantasma de nomes como Moustaki ou Jean Ferrat mas as suas influências surgem também do outro lado do atlântico. "Quando comecei a cantar, ouvia essencialmente os songwriters americanos (Townes Van Zandt, John Prine, Guy Clark, Bob Dylan, Steve Earle, Leonard Cohen) cujas poesias me dizem muito. Na chanson française os meus mentores vão desde Barbara a Bertrand Belin, passando por Moustaki, Pierre Vassiliu, Dominique A, Jacques Bertin, Jean-Louis Murat ou Gainsbourg", revela ao JN.
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"Tento não ficar aprisionado em restrições estreitas quando escrevo as canções e os primeiros esboços resultam quase de escrita automática - ainda nem sei o que vou contar no momento em que a tinta se pousa no papel", explica-nos Baptiste W. Hamon. "Depois oriento esse rascunho para paisagens que me sejam familiares. Existem temas que me inspiram mais do que outros e então tento cavar nessa direção: o gosto que podemos encontrar em cultivar a tristeza em vez de rejeitá-la, por exemplo. Ou a erotização do mundo, dos nossos encontros quotidianos", conta.
Baptiste W. Hamon esteve no Porto há poucos meses para gravar o disco de Alma Forrer, sua cúmplice, e com a qual assinou duetos magníficos. Diz-nos ter ficado "completamente apaixonado pelo Porto". Vale a pena clicar para ouvir o resultado de uma dessas gravações.
Outro talento que não pode nem deve passar despercebido é Martin Rahin, rapaz hábil a depositar boa poesia nas suas canções. A conversa com o JN pode ser lida aqui. Uma das suas criações mais inspiradas é "La Bravoure du Velours", que o próprio assume ser "uma provocação em forma de duelo contra a burguesia cultural francesa que goza dos seus privilégios sem merecê-los".
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Martin Rahin é assumidamente influenciado por Boris Vian "que para além de ser um grande poeta é um grande poeta com sentido de humor" e encara Barbara como "a mais genuína", elogiando-lhe "tanto as melodias como os textos e a sua maneira delicada de tocar piano". Jacques Brel também lhe é muito especial. "Tem uma dimensão humanista nas suas canções que o levam além do simples papel de cantor", refere. "Eu vejo-o como um monge, um santo".
Hoje assume-se fascinado pelos Feu! Chatterton "que têm conseguido fazer uma bela aliança entre tradição e modernidade" e pelas letras de Paul Hazan "que tem belíssimos textos muito alucinados, muito verlaineanos". Os Feu! Chatterton são uma das bandas que mais tem dado que falar nos últimos meses.
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Martin Rahin é também um ávido leitor da obra de Fernando Pessoa, "um dos maiores poetas" e em cuja obra vislumbra "uma pureza que apenas descobri nos poetas antigos gregos, árabes e chineses". O francês exalta "o elogio despretensioso da sensualidade, ao dizer que uma rosa é bela porque é não é nada mais do que uma rosa, e que ela é bela porque enquanto eu a olho o tempo passa". "A mística do instante na obra do Pessoa é muito forte, sobretudo no poema "Passagem das horas" que eu considero como um talismã", afirma.
Em tempos idos, Martin Rahin entregou-se a experiências pouco convencionais para tentar acender o acto da escrita: ficava 24 horas de olhos fechados, passava horas em jejum ou experimentava escrever debaixo de água. "Fiz isso quando era mais jovem porque acreditava numa separação formal entre os meus sentidos e o real. Tratava-se de me colocar ao nível do real, de entrar em vibração com ele com o mínimo de lixo possível", expica-nos. "Mas essas técnicas eram apenas artifícios, experiências".
Apesar de não ser propriamente novo na área - já grava discos há mais de 10 anos - Bastien Lallemant lançou recentemente um disco bastante recomendável como pode ser testemunhado por esta amostra: "Le viel amour", um dueto com Françoiz Breut. Indispensável.
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Um dos mais elogiados na cena indie francesa é Alexandre Delano. Outrora liderou The Delano Orchestra e a sua deliciosa pop de câmara e agora assina discos a solo. Cresceu a ouvir Gainsbourg, Higelin, Brassens ou, mais tarde, Jean-Louis Murat e Superflu. "Eau", o seu recente disco, é "um diário de bordo de uma vida aquática e amorosa, escapadas mediterrânicas, passeios de bicicleta e viagens de comboio".
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Assinale-se também o duo Jo Wedin & Jean Felzine. Ela é sueca mas faz questão de cantar em francês.
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Os apreciadores da pop mais eletrónica poderão sintonizar-se na música de La Fèline, a banda de Agnès Gayraud. Ela cresceu a ouvir Brigitte Fontaine, Etienne Daho, Yves Montant, Jean-Louis Murat ou Gérard Manset e hoje labora aquilo a que designa "new wave, chanson deep, en français".
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Registe-se também Bertrand Belin, cuja voz poderá cair no goto dos fãs de Matt Berninger, salvaguardadas as devidas distâncias.
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Ou ainda Marc Di Malta, um cantor que apresenta a sua música como "uma escada rolante para lado nenhum".
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