Na noite de receção ao campista no Sudoeste, os irmãos belgas Dimitri Vegas e Like Mike demonstraram porque são considerados dos melhores DJ do Mundo.
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A forma de criarem empatia com o público com choques anímicos, feitos de remisturas de êxitos comerciais de John Legend ou de outros cantores no topo, arrasam por completo os seus pares. Nas criações de Vegas vive reggae, samba e percussões mais ricas do que 3/4 do rock, mas que resultam igualmente harmoniosas.
Para aumentar o delírio, o irmão Like Mike dança de micro na mão, em cima da mesa e grita palavras provocativas e de incentivo ao público. Desce do palco para cumprimentar os fãs e para "partilhar o amor" dá de beber vodka a toda a primeira fila. Como se não fosse o suficiente, têm um espetáculo audiovisual apuradíssimo a decorrer durante os seus sets. Não há golpes de sorte, há muito trabalho. E o público reconhece.
O português Kura foi recebido com cartazes de apreço e com palavras de ordem como "(Lo)Kura" ou "Kura és nosso". Fumo e fogo (a relembrar Ramnstein), de sobra, ensombraram o DJ que debitou êxitos como "Summer" de Calvin Harris,"Waiting for love" de Avicii, "Welcome to the jungle" de Lil John ou "Lean on" de Major Lazer. Deixando os devidos silêncios para o público completar a letra, depois de vários exercícios em que a cada "1,2,3,4" há uma explosão de público em coros de "ehhhh ohhhh ehhhh ohhh", intercalados com êxitos atemporais de rock de bandas como os Queen, Red Hot Chili Peppers ou Nirvana.
Para abrir as hostilidades, na Herdade da Casa Branca atuaram os Wolfpack. O primeiro uivo soou às 23 horas, pondo o público de braços no ar e pernas saltitantes. Para agitar a maré de gente, primeiro vaza logo cheia, desfilou logo uma série de remakes de temas de John Legend, Suzanne Vega e de Calvin Harris, que atua no festival esta quinta-feira. Os campistas deixaram-se consumir pela batida, que marcou o ritmo do resto da noite.
Meo Sudoeste: dia 1
Há uma lezíria imensa a perder de vista onde sobrevoam andorinhas e as cegonhas se acomodam no alto das torres de eletricidade. De repente surge uma feira popular, com torres e palácios de atrações, mas aqui as mulheres de barba, o homem mais forte do Mundo e todo o freak show são marcas publicitárias que oferecem tudo a todos e ao melhor preço. Ou melhor, vendem para que guardem uma recordação da passagem por aqui feita.
À entrada no recinto, que tem montanha russa incluída, nem todos têm a mesma vantagem competitiva, há quem seja VIP, há quem venha por um dia, há quem tenha carro e tenda, há quem venha de Expresso e há quem não tenha nada. Aqui as castas recebem marcas de diferentes cores: rosas, azuis, prateadas, castanhas. Mas todos têm de caminhar pelo campo de gafanhotos que saltitam quando os exércitos de pés se aproximam.
"A senhora aluga quartos?"
A vila da Zambujeira está pejada de pessoas, há autocarros em barda que levam e trazem gente que vem procurar munições antes de chegar ao campo de batalha. A maioria são jovens, muito jovens, queimados de sol e distribuem-se em equipas, alguns cedem ao cansaço e deixam-se desmaiar nas soleiras das portas dos alentejanos que ali vivem e tentam saltitar, com o vagar que a idade lhes permite entre os jovens. Afinal, nestes dias, a Zambujeira do Mar é deles.
Um equívoco leva uns festivaleiros a entrar casa adentro de uma senhora que ali conversa de porta aberta: "É a senhora que está a alugar quartos?". A senhora sorri. "Não, isso é ali mais abaixo", clarifica. Um adolescente esparramado atira: "Cheguei agora de Vila do Conde, venho todos os anos ao Sudoeste, vamos lá ver se está como eu o deixei", diz um adolescente para outro, impressionado, mas que não se dá ao trabalho de ripostar as credenciais que o outro lhe dá.
O supermercado da vila da Zambujeira parece tirado de uma zona de pós-guerra a viver em racionamento. Na porta, um rapaz empoleirado em cima de um degrau tenta segurar a multidão com os seus olhos doces e corpo franzino e explica: "Só pode entrar uma pessoa de cada vez e sem sacos!". Lá dentro, a gerente, enérgica ao telefone, conta moedas enquanto explica a um fornecedor: "Olhe, acabou o Red Bull e já só tenho duas cervejas, preciso que me tragam isso rápido".
Os irmãos de sangue e as Supremes
Rebeca e João Baptista são irmãos de cabelos tingidos de vermelho sangue, cor especial para o Sudoeste, que vieram desde Setúbal só para ir ao festival. Já não é a primeira vez que vêm e adoram. João, 14 anos, acha que "este ano é melhor por causa da música portuguesa". A irmã Rebeca, 20 anos, protegida atrás de uns óculos que servem de espelho a quem por ela passa, tem mais dúvidas. Mas quanto ao cartaz são unânimes: por eles era "só música eletrónica, dispensámos essas kizombadas como Anselmo Ralph e a Pérola".
Andreia Salomão, Keila Lima e Kátia Nascimento são três estudantes cabo-verdianas a residir em Portugal. Keila veio do Porto, onde estuda Engenharia de redes. As outras duas de Lisboa. Conheceram-se todas no festival por intermédio de um amigo e juntas fazem todo o sentido. Divas altas e lindas com os seus cabelos afro, parecem uma versão contemporânea das Supremes.
Inês Almeida, está no Meo Sudoeste com as suas melhores amigas para comemorar a despedida de solteira: "Caso dia 20, em Aveiro", confessa. A escolha do Sudoeste tem um significado especial, foi aqui que ela e o seu futuro marido se conheceram, mas "há dez anos", desde aí nunca mais voltaram. O cartaz para este grupo de amigas "não importa, é só para nos divertirmos".
Joana Ribeiro, melhor amiga dentro das melhores amigas, deslinda: "É uma festa para todas, porque vamos reviver o tempo em que éramos mais novas e vínhamos todas aqui para o festival, para nós é uma espécie de revival e o fim de um ciclo de uma fase das nossas vidas", conclui.
Todos ao mesmo: "Eat, sleep, rave, repeat"
As tribos que os esperam viver ao máximo o Sudoeste são imensas. No campismo há a tribo do amor que o promete grátis, há outras mais lascivas que prometem orgasmos. Também há a dos beneméritos da Cáritas que para se sentirem filantropos começaram por vir doze ao festival e agora já são 34, outros apenas dão palavras de ordem: "Eat, sleep, rave, repeat" e têm colunas de som que obrigam todo o parque a alinhar na rave, queira ou não queira.
Ângela Cabral, Patrícia Henriques, Bárbara Ruivo e Ivan Grande afixaram um cartaz sugestivo na porta de entrada do seu condomínio privado: "Proibida a entrada a sóbrios", mas, confessam, "é por brincadeira". Têm idades entre os 24 e os 31 anos e para eles os nomes que os fizeram reencontrar-se desde Lisboa e de Madrid até a Zambujera foram "Steve Aoki, Emily Sandé e Carlão". Quanto aos bilhetes, não os acham muito caros. Como explica Bárbara "há imensas atividades, muitos músicos". Abriu o Sudoeste 2015, começou a invasão.