
Ian Anderson, de 76 anos, com a sua mítica flauta
FOTO: Rita França
Histórica banda liderada por Ian Anderson percorreu quase 60 anos de discos, em duas horas de concerto, num Coliseu do Porto cheio de público maduro.
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A flauta. Foi esse o contributo mais significativo dos Jethro Tull para o universo do rock. Introduzir a flauta. Nos quase 60 anos de história da banda de Blackpool, no Reino Unido, a flauta esteve omnipresente: da estreia, em 1968, com “This was”, ao último disco, que é de 2023, “RökFlöte”.
Em qualquer registo, do blues à folk, do hard rock à eletrónica, sempre a flauta em contraste e desafio com os outros instrumentos. Foi também assim no Coliseu do Porto, esta quinta-feira à noite, ao longo das duas horas de espetáculo da banda liderada por Ian Anderson.
Logo na abertura, o vocalista equilibrou-se numa só perna e soprou a flauta – e essa imagem é o logótipo do grupo. Também a voz de Anderson, de timbre jovial, se mantém inconfundível, apesar do fôlego, que parece sobrar nos momentos do sopro, ficar algo aquém nas partes de maior exigência vocal.
Ainda assim, o espetáculo encheu as medidas das centenas que esgotaram o Coliseu – público maduro e conhecedor da discografia do grupo: “Thick as a brick!”, gritava-se. Reclamação não atendida: um dos discos centrais da fase progressiva dos Jethro Tull ficou de fora. Em compensação, soaram três temas de “Aqualung”, talvez o mais consagrado dos seus álbuns. E percorreu-se boa parte da obra num concerto dividido em duas partes.
Conta-me histórias
Além da flauta, há outra marca de água na música dos Jethro Tull: as histórias. Cada tema conta uma e cada uma era explicada por Ian.
“Heavy horses”, do álbum homónimo, plena fase pastoral dos britânicos, fala com desgosto do desaparecimento dos enormes cavalos da raça Shire. “Wolf unchained”, do último trabalho, remete para a mitologia nórdica. E “Mrs Tibbets”, extraído de “Zealot game”, convoca a mãe de Paul Tibbets, capitão do B-29 que largou a bomba atómica sobre Hiroshima no crepúsculo da II Guerra – a alcunha dada ao avião é parte do nome da mãe: Enola Gay Tibbets.
“E se não ficaram deprimidos com esta, garanto-vos que ficam com a seguinte”, disse Anderson ao lançar “Dark ages”, canção sobre o fim do Mundo. “Mas não se preocupem”, continuou o flautista: “Não será hoje nem amanhã. Talvez daqui a duas semanas”.
E assim, entre flautas, histórias e uma boa dose de “wit” se cumpriu o concerto de uma das mais vetustas instituições do rock.
