
Tilda Swinton, protagonista e coprodutora de "Memory", ao lado do realizador Apichatpong Weerasethakul, na conferência de imprensa de apresentação do filme em Cannes
John MacDougall/AFP
Apichatpong Weerasethakul e Jacques Audiard podem vencer de novo o prémio maior do festival de cinema francês.
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Além do italiano Nanni Moretti, vencedor da Palma de Ouro em 2001 com "O quarto do filho" e que apresentou há dias "Três andares", sempre um candidato a fazer parte de qualquer palmarés, há mais dois cineastas de que foram vistos nos últimos dias os mais recentes trabalhos e que também podem repetir o prémio mais desejado do circuito internacional de festivais de cinema.
O tailandês Apichatpong Weerasethakul saiu de Cannes 2010 com a Palma de Ouro na mão depois de aí ter estreado "O tio Boonmee que se lembra das vidas anteriores". Já tendo passado por Portugal para uma instalação e um espetáculo multimédia, o realizador, um dos autores mais exigentes e amados do cinema contemporâneo, deslocou-se desta vez à Colômbia para aí realizar "Memória".
Têm sido muitos os criadores de várias proveniências tentados por meios financeiros de países que lhes são estranhos, num processo que se percebe ser difícil de recusar. Os resultados, no entanto, nem sempre são os melhores, sobretudo quando cineastas muito enraizados na sua cultura e no seu espaço vão trabalhar para outras paragens, É sintomático o caso do mestre iraniano Abbas Kiarostami, de que dificilmente se pode dizer que os filmes rodados em Itália e no Japão se encontrem entre os melhores da sua filmografia.
Felizmente, não é o que acontece com o Weerasethakul, que acompanha no seu filme uma escocesa, interpretada por Tilda Swinton, também uma das produtoras da longa-metragem, e que se encontra em Bogotá para visitar a irmã. Só que começa a ouvir um estranho som, um forte bang, que um técnico de som para cinema tenta reproduzir. O contacto com uma antropóloga e com um pescador, em plena selva, trará pistas sobre as origens desse som.
Apichatpong mantém-se fiel à sua estética, ao seu tempo narrativo, a um cinema que vem dos sonhos e das inquietações, à espiritualidade, aos ambientes sonoros e a uma imagética muito própria, a uma relação do humano com a natureza. Mesmo que o júri presidido por Spike Lee não lhe atribua uma segunda Palma de Ouro, "Memória" é de longe a melhor obra da competição de Cannes 2021, o único caso em que, mais do que um filme, estamos na presença de Cinema, aquela forma de arte e de expressão que tanto amamos.
Jacques Audiard também está na liça e deve ter ficado viciado com o gosto da Palma quando triunfou em 2015 com "Dheepan". O seu novo filme chama-se "Les Olympiades", o nome que é dado ao 13.º bairro de Paris. É aí que encontramos Émilie, uma jovem de origem chinesa que vive no apartamento da avó, trabalhando em atendimento telefónico. Émilie conhece Camille, um professor negro que responde ao anúncio para partilhar o seu apartamento. Este deixa-se seduzir por Nora, que retomou os estudos, mas é confundida numa festa por Amber, que tem uma linha de encontros eróticos. Três jovens mulheres e um homem, uma paisagem urbana, amizade, amor, sexo, um retrato sobre as relações humanas hoje, com delicadeza, estilo e bom gosto, num preto e branco que não é intrusivo e se esquece ao fim de alguns minutos. Audiard de novo em forma, num guião que escreveu com duas argumentistas, Léa Mysius e Céline Sciamma.
