Livro que conta a experiência de um médico português na Amazónia durante a pandemia da covid-19 marca primeira incursão da Zigurate na banda desenhada.
Corpo do artigo
26 de Janeiro de 2021. Em plena pandemia da Covid-19, Luís Moreira Gonçalves, médico português a trabalhar em S. Paulo, no Brasil, recebe um e-mail do Governo do Estado da Rondónia sobre "a extrema necessidade de recrutamente e contratação imediata de profissionais médicos para laborar no combata à Covid-19". Apesar de leccionar na universidade e não ter propriamente experiência em hospitais, sentiu que tinha de responder positivamente àquela chamada.
"Dormindo entre Cadáveres", a estreia dos Livros Zigurate na edição de BD, narra a sua experiência na primeira pessoa. O relato evoca tudo aquilo por que passamos durante a pandemia, o que vivemos, o que aprendemos, o que ouvimos, o que soubemos. E, possivelmente, factos de que nem chegamos a saber: as condições extremas de trabalho de médicos e enfermeiros, operações feitas sob um guarda-chuva devido às infiltrações ou às escuras porque os geradores não arrancavam, a falta de medicamentos e equipamentos, a dificuldade de lidar com os familiares, os negacionistas...
E, como reverso da medalha, a falta de bens de primeira necessidade nos supermercados, o seu açambarcamento, o incumprimento das normas de higiene e segurança mais básicas...
De comum a todos, o desconhecimento, o medo, a desinformação, os que procuravam refúgio na religião, no isolamento, no exercício físico, na alimentação como solução ou panaceias para o momento que se vivia.
Tudo assombrado pela multiplicação de vítimas, pelo sentimento de impotência, com os pesadelos recorrentes relacionados com os pacientes que morriam... E, sempre, constante, absurda, inamovível, a maldita burocracia que, lá como cá, privilegia a passividade e a questão financeira independentemente das vidas humanas.
Luís Moreira Gonçalves, em parceria com o desenhador brasileiro Felipe Parucci, evoca assim os piores meses da pandemia numa obra de traço rápido e dinâmico, que proporciona uma leitura fluída mas intensa e incómoda, para que o que já foi esquecido seja de novo lembrado. Porque não sabemos o que pode vir por aí.