D'ZRT: "Continuamos os quatro juntos, porque senão as coisas não estavam assim"
Dois já foram, falta um: a Super Bock Arena recebe, no domingo, o último de três concertos D'ZRT no Porto (todos esgotados). Em entrevista ao JN, a banda conta como está a ser voltar e fala da saudade como força motriz deste movimento que não pára.
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"Brutal", "indescritível", "incrível", "maravilhoso" - aos D'ZRT não faltam palavras na hora de fazer o balanço do regresso, mas o melhor adjetivo é mesmo o brilho nos olhos de cada um quando falam de como está a ser voltar. Passaram quase 20 anos desde que Cifrão, Vintém e Edmundo saltaram para os palcos e para os discmans e leitores de MP3 da juventude à boleia do sucesso de "Morangos com Açúcar", dando um novo significado a um nome que, até então, era só "sobremesa" em inglês. E passaram 12 anos desde o ponto final a que agora se juntam dois à frente. Tiveram todo o tempo para mudar, percorreram os seus sonhos, trilharam o caminho a seguir e, quando foi o tempo certo, quiseram voltar.
"Ninguém estava à espera disto, ninguém achava que nós íamos conseguir fazer o que estamos a fazer. Nem nós, sinceramente", conta Cifrão, sobre um espanto e admiração que se repetem. "Quando D'ZRT surgiu, ninguém estava à espera que tivesse o 'boom' que teve. Depois, quando recomeçámos, também ninguém estava à espera que isto fosse mais do que um concerto, e de repente é... Está a ser indescritível."
Com 12 concertos anunciados no verão passado (já todos esgotados ou a esgotar), a digressão "Encore Tour" vai a meio e tem superado as "melhores expectativas" do grupo, incontornável ícone da cultura Pop portuguesa dos anos 2000, que hoje recebeu o JN numa Super Bock Arena ainda despida, em contagem decrescente para a segunda noite de concerto no Porto, que se despede da banda no domingo (em que haverá uma participação surpresa). "Eu acho que ninguém pode achar que vai conseguir esgotar 12 datas como nós estamos a fazer. Nós prevíamos fazer um espetáculo, alugámos o Altice Arena para seis mil pessoas, com a configuração mínima, e depois tudo o resto foi acontecendo", diz Cifrão.
O sucesso da "festa" que tem sido este regresso explica-se por um "conjunto de fatores", que vai além do facto de continuarem os três bonitos, como disseram entre risos. Deve-se ao impacto que a banda teve e que "marcou uma geração". Aos Morangos, que continuaram repetidamente no ar, cativando novos fãs e fidelizando os antigos. Às "músicas certas", lançadas "na altura certa" e "que impactaram as pessoas da forma mais bonita". E ao saudosismo, à saudade do passado, de um tempo mais fácil em que "as pessoas não tinham problemas nem responsabilidades", porque ainda não tinham idade para os ter. É que D'ZRT é voltar atrás no tempo, e lá atrás há muito do que não há cá à frente.
"As pessoas estão com muitas saudades de como era a juventude, de como era viver lá atrás, porque o mundo era mesmo diferente", partilha Vintém. "O que as prende a nós é esse sentimento que as transporta. Saem do seu espaço natural para viajar no tempo", completa Edmundo, que vê o universo D'ZRT como uma "bolha cor-de-rosa" onde é tentador entrar, sobretudo em tempos tão conturbados como os que vivemos hoje.
Nós já fizemos muitos concertos na nossa altura, mas nunca como estamos a dar agora. As pessoas estão a viver connosco esta viagem de uma forma muito diferente.
Revisitar músicas que viraram hinos - sobre amor, sobre sonhos, sobre energia positiva e força, com toques de intervenção - faz hoje todo o sentido a estes três rapazes crescidos, que já vão na ternura dos quarenta e com bebés ao colo ou a caminho. "Quando compusemos a maior parte delas, foi uma coisa tão genuína, tão espontânea, que obviamente fizemos com intenção e com conteúdo. E hoje, revivendo todas as músicas e todas as letras, as mensagens que cada uma tem fazem todo o sentido. O 'Querer Voltar' faz mais sentido do que nunca. O 'Caminho a Seguir', 'Todo o Tempo', 'Revolução', 'Verão Azul'. Lá está a tal viagem", diz Vintém,
"As pessoas cantam as músicas todas do princípio ao fim. E o mais incrível é que nós já fizemos muitos concertos na nossa altura, mas nunca como estamos a dar agora. Desde a primeira fila até à última pessoa, está toda a gente a levantar o braço, a bater palmas, a cantar as músicas. A energia na sala está distribuída por todo lado e é igual. Isso é muito bonito de ver e está completamente diferente nesta tour. As pessoas estão a viver connosco esta viagem de uma forma muito diferente, muito diferente mesmo", relata Cifrão.
A esta viagem "brutal" ao passado, têm-se juntado muitos passageiros, acrescenta Edmundo. "Há muita gente nova que nunca tinha visto um concerto e que acaba por experienciar aquilo que eram os concertos na altura, com uma atualização do agora. Tem sido maravilhoso trazer as pessoas de lá de trás connosco, reviver esses momentos do passado, e conseguir transportar as novas pessoas, esta nova geração que nos acompanha hoje, até lá atrás."
Voltaram no "tempo certo"
Ao longo dos últimos 12 anos, os três estiveram sempre desencontrados sobre a ideia de regresso. "Havia sempre um que não estava preparado, para quem não era o tempo certo. E esta altura foi unânime para os três. Eu costumo dizer que há uma palavra que explica o motivo desta junção, que é a saudade. Tínhamos saudades de subir a palco e de estar com as pessoas", diz Cifrão. "Foi muito forte para nós há 12 anos. E esperámos o momento certo da forma mais natural possível. Cada um precisou do seu tempo e agora faz todo o sentido", completa Vintém, certo de que "há algo especial" ali no meio dos três, que não são três. "Continuamos os quatro juntos, porque senão as coisas não estavam assim tão em sintonia."
A perda precoce de Angélico Vieira (que morreu em 2011, na sequência de um acidente de viação) obrigou a irremediáveis lutos e processos difíceis, também na hora de voltar. "Passámos por vários momentos. Nós quisemos fazer isto com muito carinho. Sabemos que não é a mesma coisa. Sabíamos que nos ia faltar ali alguém tão importante connosco. E tentámos, com muito trabalho, com toda a parte musical por trás, tentar fazer o melhor que conseguíamos os três e criar um espetáculo em que ele estivesse sempre presente. E ele está presente. A energia que se vive na sala é quase como antigamente", partilha Vintém, que, ao fim de nove meses de preparação para a digressão, está em paz com o caminho. "O início foi muito complicado. Começámos a sentir tudo aquilo e não sabíamos como é que iria ser. Hoje olhamos e recordamos as coisas boas e isto acima de tudo é uma festa. É para recordar os momentos altos."
Um desses momentos foi o primeiro grande contacto com o público, no primeiro espetáculo na Altice Arena, em Lisboa, quando, na primeira paragem do concerto, a banda levou um banho de amor que, quase um mês depois, ainda transborda do sorriso de Edmundo. "Não estávamos à espera dessa receção. Ficámos completamente sem reação, ficámos a absorver aquilo. O barulho era ensurdecedor em cima do palco. E aquilo foi uma cena que eu nunca tinha visto. Sem querer exagerar, foi mais de dois minutos. As pessoas ovacionaram a nossa chegada. A legenda que eu coloco por baixo daquela ovação é 'obrigado por estarem aqui, tínhamos muitas saudades vossas'. Foi a forma como eu recebi aquela ovação. O carinho foi tão grande, tão grande, tão grande. Nós derretemos ali em cima do palco", recorda o cantor.
Fim no Algarve em agosto: "Queremos acabar da melhor forma possível"
Produtores do próprio espetáculo, amigos antes de colegas e guardiães maiores da conexão com o público (que no Porto é especialmente tenaz e fervoroso, admitem), Cifrão, Edmundo e Vintém - que nunca deixaram de estar ligados ao meio artístico - garantem que toda a digressão foi pensado por si ao pormenor e com o maior dos cuidados, para "retribuírem o amor" com que foram inundados. E, com "respeito, consideração e admiração" uns pelos outros, seguem mais alinhados do que nunca, acompanhados pela noção, amadurecida pelo tempo, de que os pontos fortes de cada um trazem ao de cima o melhor produto possível.
Sobre o futuro, e embora Edmundo goste de dizer que "com D'ZRT nunca se sabe", o plano é terminar no Algarve, a 19 de agosto, em pleno "Verão Azul". Cifrão transforma as reticências românticas em pragmatismo e explica: "Temos 12 concertos. E está previsto terminarmos. Nós propusemo-nos a fazer estes 12 concertos. Obviamente, muita coisa pode acontecer. Mas a forma como nós vemos as coisas é ter isto fechado e fazê-lo bem, de uma forma bonita, com muito amor pelas pessoas que nos vêm ver e pelo projeto que tivemos. E queremos acabar da melhor forma possível. E por isso é que delineámos as coisas para fechar desta forma".
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