Elvas acolhe 30 exposições simultâneas com algumas das coleções de arte contemporânea mais representativas do país
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A FARRA, Festa da Arte em Rede na Região do Alentejo, arrancou este fim-de-semana, em Elvas, e prolonga-se até dia 25 de agosto, com 30 exposições simultâneas e um programa de atividades paralelas que inclui performances e diferentes atividades de educação e mediação cultural. O evento é organizado pelo Museu de Arte Contemporânea de Elvas (que acolhe, a título permanente, a Coleção Cachola) e tem como objetivo convocar para aquela cidade raiana um conjunto de coleções, sobretudo privadas, que se distribuem em projetos de curadoria por vários espaços, mais ou menos habituados a acolher arte contemporânea.
Entre as coleções estão as de Peter Meeker, Maria e Armando Cabral, Fundação Leal Rios, Fundação Carmona e Costa, Fundação PMLJ, MAAT / Fundação EDP, Figueiredo Ribeiro, José Carlos Santana Pinto, Fundação Millennium bcp, a Coleção de Arte Contemporânea do Estado, entre outras, fazendo a enumeração por defeito.
A Coleção Norlinda e José Lima, em depósito no Centro de Arte Oliva em São João da Madeira, é outra das que marca presença e, permitindo-me à preferência, ocupa um dos baluartes do Forte da Graça, monumento que é referência entre a tipologia militar do século XVIII e que carrega, simultaneamente, as estórias da defesa da fronteira e da prisão em tempos de ditadura e servidão. Imponente e labiríntico, o edifício convidou a uma proposta de curadoria que potenciasse a dimensão simbólica, numa abordagem cenográfica e, simultaneamente, política.
Alberto García-Alix (ES, 1956), Alexandre Baptista (PT, 1969), Antón Lamazares (ES, 1954), Antoni Clavé (ES, 1913-2005), Carmen Calvo (ES, 1950), Eduardo Chillida (ES, 1924 - 2002), Enrique Marty (ES, 1971), Eva Lootz (AT, 1940), Gonçalo Mabunda (MZ, 1975), Isabel Muñoz (ES, 1951), Jaume Plensa (ES, 1963), João Louro (PT, 1969), João Maria Gusmão + Pedro Paiva (PT, 1979, 1977), José de Guimarães (PT, 1939), José Manuel Ciria (GB, 1960), Julião Sarmento (PT, 1948), KCHO (Alexis Leyva Machado) (CU, 1970), Lucio Muñoz (ES, 1929 - 1998), Manuel Rivera (ES, 1927-1995), Michelangelo Pistoletto (IT, 1933), Nuno Cera (PT, 1972), Rui Chafes (PT, 1966), Rui Toscano (PT, 1970), Santiago Ydáñez (ES, 1967), Valter Vinagre (PT, 1954), Victor Mira (ES, 1949)e Yonamine (AN, 1975) são os artistas que dão corpo à exposição "Manuscrito encontrado numa garrafa", título apropriado de um conto de Edgar Allan Poe (EUA, 1809-1849). Publicado em 1831, a estória de Poe fala-nos de um personagem que vê o seu destino interrompido pelo inesperado, deixando-se inundar pelo medo do desconhecido.
O universo fantástico de Poe e a nobreza do Forte da Graça, constituem-se assim como os motes para esta exposição que reúne cerca de trinta autores, incluindo um bom número de espanhóis, para explorar os conceitos de medo, solidão e fronteira que se adivinham como endémicos da pós-modernidade.
Através de um circuito narrativo que interpreta, metaforicamente, o conto de Poe, os públicos deambulam por obras que exploram materiais e tecnologias como o vídeo, a fotografia, a pintura, a escultura, a assemblage ou a instalação e que se apropriam das linguagens da luz e da sombra, da presença e da ausência do corpo, mantendo um clima de tensão que convida à descoberta, também, do património. Esta exposição trata-se, assim, de um exercício literário e de uma proposta de viagem à memória, ao passado, ao oculto, ao medo, alertando-nos para os perigos da inércia e do individualismo e para o efeito castrador do medo que só combatemos construindo com um mundo com menos fronteiras.
Esta é apenas uma proposta entre o muito que há para ver em Elvas nos próximos dias e um exemplo da vitalidade que a dinamização cultural traz aos territórios, sendo capaz de os retirar de um aparente abandono a que pareciam votados.