No novo disco a solo, "Every loser", Iggy Pop retoma a energia fulgurante dos primeiros tempos, depois do tom mais introspetivo dos últimos álbuns.
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"Este é um disco para vos dar uma carga de porrada", avisou Iggy Pop no lançamento de "Every loser", o seu 19.º esforço a solo. A caminho dos 76 anos, o mais icónico rocker que ainda respira voltou à energia primordial dos The Stooges para baralhar aquela frase que tanta gente diz: "Quem me dera ter 30 e saber o que sei hoje." Pois em Iggy não há desfasamento - corpo e cabeça convergem num frenesi acutilante e maduro, num comentário sem baias ao tempo presente.
O que poderá surpreender quem viu nos últimos álbuns, "Free" (2019) ou "Post pop depression" (2016), carregados de melancolia e spoken word, um recolhimento da "iguana", um chegar-se à lareira para invocar memórias. Mas bastava vê-lo ao vivo - tronco nu selvagem e cabeleira em chamas - para suspeitar que o homem não estava ainda pronto para jogar à sueca no Marquês. "My mind is on fire when I should retire", canta ele em "Frenzy", tema de pulsão hardcore que inaugura o álbum. Nem um "canto do cisne" parece: é só Iggy, como um "teimoso", a regressar à pose desembestada que o eternizou.
A relação com a idade, feita de desafio e sabedoria, é esquadrinhada também em "Strung out Johnny", onde não pede desculpa pelos seus abusos com drogas no passado, mas transmite uma experiência, fala do que sabe, para que quem o ouça saiba o que o espera. Há canções que começam por ser baladas e terminam em motins, como "The regency", um manguito bem espetado à indústria musical, espécie de "EMI" do século XXI. As alterações climáticas não lhe escapam em "New atlantis", que é também uma ode a Miami (cidade de adopção), e em "All the way down". Goza com a caricatura em que o punk se tornou nalgumas bandas recentes ("Neo punk") e não esquece os trolls das caixas de comentários em "Comments."
"Every loser" reúne uma autêntica superbanda para acompanhar Iggy, com elementos de Jane"s Addiction, Red Hot Chilli Peppers, Pearl Jam ou Guns N" Roses. E tem produção de Andrew Watt, que trabalhou com Morrissey e Ozzy Osbourne. É a pedrada urgente de uma autoridade.
"Every loser"
Iggy Pop