Margarida Gil estreia esta quinta-feira na Berlinale “Mãos no Fogo”, o principal representante do cinema português na edição deste ano do festival alemão.
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Presença maior do cinema português na edição 2024 do Festival Internacional de Berlim, “Mãos no Fogo” tem esta quinta a sua estreia mundial, pelas 16h30, na Academia das Artes. O filme de Margarida Gil está a concurso na mais recente seção competitiva da Berlinale o Encounters, e pode assim suceder no palmarés do festival a outro filme português, “Mal Viver”, de João Canijo, que o ano passado venceu o Prémio do Júri da competição principal.
Se Carlo Chatrian realçou a ligação d euma vida a João César Monteiro, quando anunciou a seleção do filme para Berlim, é de inteira justiça, no entanto, sublinhar a identidade da obra de Margarida Gil, por direito próprio. Aos 73 anos, e com mais de três dezenas de obras assinadas ao longo de uma carreira de praticamente meio século, a obra da cineasta tem como principais momentos, entre outros, as longas-metragens “Relação Fiel e Verdadeira”, “Rosa Negra”, “Anjo da Guarda”, “Adriana”, “Perdida Mente”, “Paixão”, “O Fantasma do Novais” ou “Mar”.
“Mãos no Fogo”, livremente baseado em “Turn of the Screw”, de Henry James, acompanha uma jovem que realiza um documentário numa mansão do norte do país, descobrindo, em busca da verdade e do real, segredos bem guardados, revelados pela sua câmara.
Margarida Gil oferece-nos uma obra intrigante que se vai descobrindo aos poucos, citando Sirk, pelo lado pictórico, Buñuel, pela animalidade, Oliveira e Agustina, pelas ambiências e pelo universo nefasto, mas sem perder a identidade do seu cinema, muito ligado à terra, aos elementos, ao corpo. No fundo, apesar de enraizado num certo classicismo, esta homenagem de Margarida Gil ao próprio cinema tem uma abordagem surpreendentemente moderna, alicerçada ainda pela magistral fotografia do mestre Acácio de Almeida. Elementos que seguramente terão influenciado, e bem, a escolha do filme para Berlim.
Antes de partir para a capital alemã, Margarida Gil confessou ter recebido “com entusiasmo” a seleção do seu filme. “Apesar de não ser a primeira vez que estou presente em festivais igualmente importantes, Berlim é uma estreia. É sempre bom para os filmes. Permite-lhes uma exposição maior, significa que muito mais gente o vai ver”.
Quanto às expetativas que traz para Berlim, a realizadora espera “que o filme seja apreciado”, continuando: “Apesar de estar numa competição, o estar selecionado já é um prémio, e a concorrência é muito boa. Mas não tenho outras expectativas.”
Margarida Gil refere-nos como foi a génese do projeto. “O livro The Turn of the Screw, traduzido em Portugal pela Calafrio, como A Volta do Parafuso, perturbou-me tanto que fiquei intrigada. Mas foi apenas o arranque. O filme voa para outras paragens.”
O filme cita vários autores, mas a realizadora não se fica por aí nas suas referências. “Renoir à cabeça”, admite, “Mizoguchi, Dreyer, os russos…”
Protagonista agora em Berlim de um dos primeiros grandes momentos do cinema português neste início de ano, a realizadora aborda assim a situação atual do cinema português: “Paradoxal. Acho que nunca houve tantos filmes bons e muito bons, e tão pouco público. Uma crítica muito feroz e intolerante, sobretudo com os nossos filmes, tem ajudado esta situação.”
“Mãos no Fogo” tem ainda previstas mais três projeções, sexta às 12.45, na sala Cubix, situada na mítica Alexanderplatz, sábado às 19h00 na sala International e no domingo 25, dia de encerramento do festival, às 13h00, de novo no Cubix. Os prémios, entre os quais da seção Encounters, serão entregues no sábado ao fim da tarde.