Pontos altos da cinematografia de Francesco Rosi, “Salvatore Giuliano” e “As Mãos Sobre a Cidade” regressam às salas portuguesas em cópias restauradas.
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Com uma vida política quase sempre atribulada, uma relação endémica entre o poder e o crime organizado e uma cinematografia vibrante, não admira que uma das matrizes mais interessantes da história do cinema mundial seja o filme político italiano das décadas de 1960 e 1970.
Nomes como Elio Petri, Giuliano Montaldo ou Damiano Damiani, entre muitos outros, sem esquecer de forma alguma a dimensão política da obra dos mestres com uma carreira mais abrangente, como Pasolini, Rossellini ou Visconti, marcaram uma época e são ainda referência para quem, hoje, considera a vertente política como uma das mais importantes do seu trabalho.
Desses nomes, um houve que se salientou, o Francesco Rosi (1922-2015) de, “Salvatore Giuliano”, comercializado entre nós como “O Bandido da Sicília” e “As Mãos Sobre a Cidade”, filmes que regressam a partir de hoje ao convívio dos cinéfilos portugueses em magníficas cópias restauradas.
Sublinhando a sua implacável dimensão política, recorde-se que “Salvatore Giuliano”, produzido em 1962, apenas chegou aos nossos cinemas três anos depois, e severamente amputado pela censura, e que “As Mãos Sobre a Cidade”, logo do ano seguinte, foi liminarmente interdito antes do 25 de Abril de 1974, estreando pela primeira vez nos nossos cinemas apenas sete anos depois da libertação e do fim da censura.
Os dois filmes agora repostos em sala de Rosi, que assinou outras obras marcantes de um cinema também chamado de investigação como “O Caso Mattei”, “Lucky Luciano” ou “Cadáveres Incómodos”, chegam-nos sob a chancela de um “cinema como testemunha”.
“Salvatore Giuliano”, coescrito por Suso Cecchi d’Amico, argumentista habitual de Visconti e um dos dez filmes preferidos de Scorsese, segue o itinerário deste “bandido da Sicília” que, na década anterior, tentara libertar a ilha do domínio italiano. Uma forma de falar de forma indireta sobre toda a problemática da sociedade italiana do pós-guerra. Como, de forma ainda mais direta, em “Mãos Sobre a Cidade”, onde aborda a corrupção ao mis alto nível na sua Nápoles natal. A modernidade do cinema de Rosi mede-se também pela tremenda atualidade do que coloca em cena.