Publicado pela Assírio & Alvim, "Epílogo" sintetiza mais de três décadas de criação literária do autor madeirense José Agostinho Baptista. De fora ficaram apenas três livros do poeta.<br/>
Corpo do artigo
Poucos autores apreenderam tão bem como José Agostinho Baptista o célebre verso de Luiza Neto Jorge segundo o qual "o poema ensina a cair". Em tudo quanto o autor de "Agora e na hora da nossa morte" escreveu em quase quatro décadas de publicação, detetamos a mesma vontade de conceber a poesia como um processo de interiorização permanente que pressupõe uma fuga ao real. Ou melhor, uma idealização do poema como forma de propor uma realidade alternativa à existente.
Duas décadas depois da primeira reunião da sua poesia, "Biografia", Baptista enceta neste "Epílogo" uma tarefa semelhante, mas só na aparência. "Por não habitarem como todos os outros a geografia plena e coerente da minha poesia em verso", no entender do poeta, três livros foram excluídos desta antologia: "Debaixo do azul sobre o vulcão" (1995), "O pai, a mãe e o silêncio dos irmãos" (2009) e "Assim na Terra como no Céu" (20014).
Embora eventualmente discutível, a opção acentua a unidade estética de uma poesia que reclama o sentido da transcendência a cada instante.
Quer na contemplação serena da "alucinante beleza que se desprende num universo de ondas e frutos apetecidos", quer na exaltação sentimental, provocada pelo arrebatamento amoroso ou pela angústia da perda, esta é uma poesia que não aspira a menos do que o absoluto.
Por entre evocações de "paraísos perdidos" e "doces colinas semeadas" "no cais dos dias atlânticos e longos", o autor nunca se esquece que "tudo são sombras e / estas são as sombras". Alimentando-se de dor, mas sem se deixar submergir por ela, esta poesia nunca coloca de lado "a extrema solidão do homem", agravada pelo inevitável desaparecimento das figuras paternas.
A noção de quão precária é a vida, e por arrasto a ilusão de felicidade, cerca também estes escritos, em que encontramos, intacta, a procura de sentido. E, por arrasto, o consequente apaziguamento trazido pela crença, no sentido religioso mas não só, numa outra dimensão.
A Madeira habita um lugar central na poesia de José Agostinho Baptista. Ela é a sua Ítaca, o terreno imaginário a que mentalmente volta com inusitada frequência, por muito distante que se encontre das paisagens familiares da sua infância. Ao convocá-la, o poeta suspende o tempo e "regressa ao esquecimento, a cada mágoa, aos moinhos de vento".