
Arquiteto de profissão, Vítor Leal Barros estreia-se nos romances com "Hotel La Solitude"
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Na sua estreia literária, Vítor Leal Barros acompanha o destino de personagens abandonadas pelo destino.
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Sempre houve uma dimensão profundamente literária na solidão que povoa os chamados não-lugares, conceito criado em 1992 pelo antropólogo francês Marc Augé sobre a despersonalização e o anonimato dos grandes espaços públicos. Dos aeroportos às repartições, estes são lugares onde a vida está sempre à espera de acontecer, o que favorece uma introspeção e um confronto interior com os quais nem todos lidam da melhor forma.
No seu primeiro romance, Vítor Leal Barros explora com habilidade estas possibilidades a partir de um mesmo lugar: o quarto 318 do Hotel La Solitude, uma unidade hoteleira algures no norte do país cujas paredes são testemunhas silenciosas através dos tempos de sucessivos dramas e alegrias.
Romance tripartido, que nos permite acompanhar a vida interior de três pessoas num momento particularmente difícil das suas vidas, esta é uma narrativa onde o espectro do desamparo está à espreita em cada canto, como se, bem vistas as coisas, afinal, estivéssemos sempre tão sozinhos. Por maior que seja a ilusão contrária.
Os encontros e desencontros em que a vida é pródiga estão plasmados nas personagens que se hospedam nesta unidade hoteleira, cada qual carregando o seu insustentável fardo de dor, em busca de uma redenção que nunca há de chegar: Irene, uma mulher confrontada com o final de um longo casamento que questiona amargamente a utilidade da dedicação plena ao marido; Luís, um homem incapaz de lidar com a morte recente da sua esposa, optando por refugiar-se num mundo de nostálgicas memórias, e Vasco, um empresário bem-sucedido que, apesar da aparente harmonia familiar e do conforto que o rodeia no dia a dia, vê-se consumido por um vazio intolerável. Desligadas à primeira vista entre si, estas três vidas partilham, todavia, ligações de foro quase secreto, quais fios invisíveis que o autor vai tecendo ao longo da história.
Livro profundamente imerso no destino de personagens a quem a vida traiu de algum modo, mas, ao mesmo tempo, aberto a todos quantos o queiram descobrir, "Hotel La Solitude" contém, apesar da predominância do tom elegíaco, outros registos e dimensões, plasmados na frase de Albert Cossery amplamente mencionada ao longo destas páginas: "estar vivo é quanto lhe bastava para ser feliz".
