Tim Roth e Vicky Krieps interpretam um casal de cineastas que se desloca à ilha de Farö, na Suécia, onde Ingmar Bergman viveu e filmou, para escreverem os seus próximos filmes.
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"A ilha de Bergman", o novo filme da realizadora Mia Hansen-Love, esteve em competição em Cannes e já está em exibição em sala. A cineasta falou ao JN à passagem recente pela Festa do Cinema Francês.
Autora de obras tão diversas como "Um amor de juventude", que a revelou; "Eden", sobre a cena musical underground francesa dos anos 1990; e "O que está para vir", com Isabelle Huppert; a realizadora de 40 anos tenta explicar qual o fio condutor da sua obra. "Acho que há temáticas que se reencontram e que os filmes dialogam uns com os outros. Há por exemplo o tema da vocação, que aparece em vários dos meus filmes. Muitos deles são retratos de mulheres tratadas de uma forma impressionista. E penso que há uma continuidade estilística."
A primeira ideia para "A ilha de Bergman" foi fazer "um filme sobre um casal de cineastas em busca de inspiração, e essa ideia cruzou-se com a de ir filmar à ilha de Farö, que também já tinha há muito tempo. Depois da morte de Bergman ouvi falar sobre a Fundação Bergman, sobre a casa assombrada pela presença de Bergman, a Semana Bergman, o Safari Bergman".
A ideia cimentou-se após um convite para ir mostrar alguns dos seus filmes a Farö. "Foi amor à primeira vista, não só pela presença que se sente de Bergman mas também pela beleza ao mesmo tempo selvagem e delicada do local", recorda. "As pessoas da fundação foram de uma grande hospitalidade, têm um enorme desejo que a memória de Bergman viva e adoraram a ideia de uma mulher francesa lá ir rodar um filme."
redescobrir as salas
Qual é, para Hanson-Love, a principal herança do cinema de Ingmar Bergman? "Revolucionou o cinema com a sua modernidade, nomeadamente na sua visão das mulheres, numa época em que o cinema se concentrava sobretudo em personagens masculinas. Olhou para elas com uma intimidade que poucos tinham alcançado. E reinventou o grande plano de uma forma que influenciou o cinema moderno."
Difícil para a realizadora é escolher o filme preferido de Bergman. "De cada vez que me perguntam mudo de opinião. Talvez "Fanny e Alexandre". Por vezes tem-se uma ideia de um cinema austero, e é verdade que fez filmes austeros, como "Lágrimas e suspiros" ou "O sétimo céu", mas também fez várias comédias. E as suas obras têm um grande ritmo, nunca nos aborrecemos a vê-las."
O casal do filme procura na ilha de Bergman o local ideal para trabalhar. Mia Hansen-Love ainda não conseguiu encontrar um sítio específico para o fazer. "Não, e gostava muito. Como levo uma vida um pouco nómada tenho de aprender a escrever em vários sítios. Mas quero voltar a Farö. Nunca gostei tanto de escrever num local como lá."
A terminar a conversa, confrontámos a realizadora com a situação atual do cinema francês. "Por um lado somos privilegiados, porque o cinema francês é bastante apoiado. Há muitos filmes que se fazem, o cinema de autor é protegido pelas instituições. Apesar das dificuldades há sempre muitas rodagens a decorrer." Todavia, "fazem-se muitos filmes e não há público suficiente para os ver. Não se pode dizer que as pessoas tenham regressado em massa com a reabertura dos cinemas. Há muito poucos filmes de autor que tiveram sucesso. Toda a gente se pergunta se o cinema de autor vai desaparecer. Espero que não e que as pessoas redescubram o caminho das salas".