"Qual o impacto das nossas vidas na macro escala do Mundo? Que fio condutor liga uma decisão a nível mundial e um gesto íntimo de um casal? Embora vivamos lado a lado, será que habitamos o mesmo Mundo? A mesma crise?"
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São algumas das perguntas capitais de "Ça va exploser", criação de João Fiadeiro e Carolina Campos que tem no seu cerne as ideias de "crise" e "suspensão". O espetáculo pode ser visto, esta terça-feira, às 22 horas, na Sala Virtual Bol.
Estreada em 2020 em Barcelona, a coreografia tem na sua base o livro "Ma vie va changer", de Patrícia Almeida e David-Alexandre Guéniot. Trata-se de um álbum de fotografias que cruza recortes de jornais colecionados entre 2011/13 - onde se registam o apogeu da "primavera árabe", a entrada da troika em países como Portugal, Grécia e Irlanda, e o desastre nuclear do Japão - e imagens da vida quotidiana do casal durante esse mesmo período, que captam, por exemplo, o modo como o filho aprende a ler e a escrever. Numa das fotografias, onde se vê escrito num balão "Ça va exploser", está mesmo a chave do título do espetáculo.
Várias questões do livro interessaram aos criadores. Desde a fronteira entre público e privado, essa linha em constante redefinição, até às várias dimensões da palavra "crise", tanto no sentido político de questionar o seu significado, que varia conforme as circunstâncias individuais - será diferente para um refugiado ou para quem perdeu dinheiro na bolsa; como no plano dos encontros pessoais, "que estão sempre na iminência de dar ou não dar certo", como diz Carolina Campos.
Essa ideia de "iminência", do estar "prestes a explodir", é a principal marca coreográfica e dramatúrgica do espetáculo, que se joga nesse "lugar da falta de comunicação onde se tenta construir algo", explica a criadora. Também a fotografia é determinante na construção dos movimentos de "Ça va exploser", e o "centro de gravidade da peça, embora sejamos bailarinos e coreógrafos e trabalhemos com a dança, é a imagem, a imobilidade", disse João Fiadeiro à época da estreia. O que se traduz numa gestualidade tensa, vagarosa, emblemática; uma espécie de pausa entre dois movimentos.
A colaboração entre João Fiadeiro e Carolina Campos remonta a 2013 e materializou-se em espetáculos como "O que fazer daqui para trás" (2015) ou "De perto uma pedra" (2018). São também parceiros na formação e investigação da "composição em tempo real", uma ferramenta teórico-prática de apoio à composição, colaboração e decisão. João Fiadeiro pertence à leva de coreógrafos surgida no final dos anos 1980 que deu origem à chamada Nova Dança Portuguesa. Carolina Campos é brasileira e vive entre Lisboa e Barcelona. Foi bailarina da Lia Rodrigues Companhia de Danças até 2011 e colaborou em espetáculos com Márcia Lança, Adaline Anobile, Iván Haidar ou Julián Pacomio.