
Em dez anos de carreira a dupla atuou outras tantas vezes em Portugal
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Dupla britânica Jungle voltou aos discos com “Volcano” e atua este domingo em Lisboa, num concerto esgotado. Prestes a fazer 10 anos de carreira, os Jungle fazem ao JN um primeiro balanço e falam de um mundo alucinante, onde se perde demasiado tempo com o telemóvel e apetece ir “morar para um celeiro”.
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São já quase 10 anos de uma carreira feliz e tantas outras passagens por Portugal. Donos de um som enérgico e característico onde o soul, o funk, o hip hop e o disco, o retro e o futurista se fundem naturalmente, os Jungle são um novo caso de apreço mútuo com o público nacional: tanto que, no seu oitavo concerto por cá, esgotaram o Campo Pequeno, onde atuam nesta noite de domingo.
Em agosto, a dupla britânica, formada pelos produtores e amigos de infância Josh Lloyd-Watson e Tom McFarland, lançou “Volcano” – 4º disco de originais – e anunciou uma grande tour norte-americana e europeia para o promover. A jornada como grupo tem sido surpreendente desde 2014, quando primeiro editaram o álbum homónimo que logo lhes garantiu uma nomeação aos prémios Mercury e lhes trouxe o sucesso mundial de “Busy earnin’”.
Depois do segundo “For ever”, por eles descrito como um disco “difícil” devido à pressão criada pelo boom inicial, em 2021 os Jungle criaram a sua própria editora (Caiola Records) e lançaram “Loving in stereo” um álbum que viria a ser marcante para a dupla, levando-a de novo aos tops e ao convite para abrir espetáculos de Billie Eilish.
Agora, em “Volcano”, há cada vez mais funk, soul e disco, e sobretudo energia e alegria, um cunho da banda, que explica ao JN que simplesmente tenta fazer aquilo que gostaria de ouvir. “Este disco é alegre sim, talvez o próximo seja mais escuro, não sei. Nós fazemos a música que queremos ouvir e eu quero fazer música onde me possa perder, música para onde possa escapar. E nem sempre queremos escapar para música escura, muitas vezes queremos escapar para música de celebração”, explica-nos o produtor, vocalista e instrumentista Josh Lloyd-Watson.
Sobre os quase 10 anos de carreira, os dois amigos – Josh e Tom conhecem-se desde crianças, do bairro londrino de Shepherd's Bush onde cresceram – admitem a “sorte” que têm tido. “Nós tivemos 10 anos muito bons, temos a sorte poder fazer isto. A verdade é que temos sido muito abençoados: foi difícil, foi fácil, foi divertido, muitas pessoas dançaram” resume Josh.
Quanto a pontos altos, entre “muitos”, destaca “o tocar no Shepherd's Bush Empire, que é ao fundo da rua de onde crescemos. E logo no primeiro disco fomos lá tocar, depois de uma juventude passada a ir lá ver bandas”, diz. Mas também “tocar em Glastonbury, ouvir uma música nossa em jogos de vídeo que jogamos, são tudo pontos altos” explica. O “principal” é no entanto, “o de poder fazer música, e poder fazê-lo de forma diária. Estamos muito agradecidos às pessoas que gostam da nossa música”, salienta.
Gravado num Airbnb
Apesar do reconhecimento, neste ponto é prematuro traçar objetivos para os próximos 10 anos, lembra o vocalista na conversa com o JN. “É muito difícil de dizer. Quando já fazes isto há 10 anos, às vezes pensas no que virá, será o último álbum? Eu não sei, será vou querer ir para um quarto silencioso e pintar? Mas sim, vamos ver, a criação sempre foi parte da minha alma, então haverá sempre algo” diz-nos Josh.
Em “Volcano”, os Jungle quiseram voltar a um lado mais instintivo e orgânico e escreveram a maior parte do disco em digressão, antes de iniciarem o processo de gravação enquanto estavam alojados num Airbnb em Los Angeles. Mais tarde, o trabalho foi concluído em Londres.
Josh explica como foi em tour que algumas das músicas começaram a nascer, primeiro com “pequenos excertos no computador, que mais tarde se transformaram em coisas”. Na fase final em Londres, a dupla gravou com a amiga e colaboradora Lydia Kitto, que se revelou crucial. “Ela é uma cantora incrível”, diz o produtor. “Foi ela quem trouxe a música para a vida, de uma forma que nunca poderíamos ter feito. Sinto que a música evoluiu para algo novo e isso é uma coisa emocionante”, frisa.
Além de Kitto, os Jungle rodearam-se de convidados como Erick The Architect, Bas (a voz de “Romeo” e “Loving In Stereo”) ou Roots Manuva. São participações que lhes surgem como naturais, no som que pretendem criar. “Nós estamos apenas a tentar criar algo, um tipo de mix de algo. Bas, Roots Manuva, são artistas com quem já tínhamos trabalhado e acho que foi o momento certo para trazer essas “vozes” de volta. Nós queríamos fazer um disco como os Gorillaz [com as várias participações], então eu acho que foi uma coisa natural”.
Captar a atenção
Quando “Living in stereo” saiu em 2021, Josh afirmara que aquele era o disco que “sempre desejara fazer”. E sobre “Volcano”? “Sim, também. Eu sinto que, cada vez que fazemos um álbum, nos sentimos mais perto daquilo que queríamos, mas mais longe de onde começámos. Mas tu não queres ficar quieto, a vida nunca fica quieta. Quem fica quieto fica esquecido”, frisa.
Não ser esquecido, manter-se relevante com todas as mudanças, com tantos artistas e tantas coisas a acontecer ao mesmo tempo, em plataformas digitais, é hoje mais difícil, admite o músico. “É essa a grande questão, não é? ‘Atenção’ é a palavra. Porque toda a nossa atenção é hoje passada de cabeça para baixo, enfiada nos telemóveis e no TikTok. Eu acho que o mundo mudou muito, muito rápido: mesmo a Inteligência Artificial, nós estamos todos a olhar para um espelho de nós mesmos. E sim, a atenção é qualquer coisa, porque tu colocas algo cá fora e é difícil cativar as pessoas como acontecia”, frisa Josh Lloyd-Watson.
Talvez também por isso, a banda continua a apostar em vídeos visionários, estilizados e coreografados, que se tornaram parte da sua identidade. “Sim, mas eu acho que temos feito sempre isso porque é fixe, porque é parte de quem somos. Nós sempre fizemos vídeos diferentes, e fizemos as coreografias de dança nos vídeos – que filmamos estilisticamente, num só take. Logo no início, a minha ideia foi ‘não seria bom se todos os nossos vídeos fossem de música e dança?’ E quanto mais o fazemos, mais as pessoas o tomam como um estilo”.
De novo, a conversa volta à internet. “Eu acho que a internet mudou tudo, e a forma como o conteúdo é consumido também mudou”, reitera o instrumentista. “Na verdade, eu não quero passar o meu tempo online – tanto tempo online. A cada dia que passa, acho que todos olhamos cada vez mais para os nossos telefones e pensamos, ‘o que estamos a fazer?’ mas é quase aditivo. E penso que não há pessoas suficientes a falar sobre isso, porque sabemos, e eu mesmo, que o faço, que é um dano para a saúde”, frisa, com um desabado: “estou cada vez mais perto de ir para campo e viver num celeiro. Há tanta beleza para ser encontrada na natureza. Acho que as pessoas precisam, que quem vive na natureza agora é um sortudo”.
Os concertos ao vivo
Agora na estrada, e com um concerto em Lisboa este domingo, os Jungle lembram que mesmo com vários convidados em disco, há maneiras de passar a mensagem e a energia. “A música é muito sobre pessoas a tocar a vivo, passar algo, a divertir-se com quem vê”. Para Josh, “ir em tour é sempre divertido, porque é como... é levar a música às pessoas, é real, sabes? Mas é um trabalho difícil, eu acho que as pessoas subestimam o quão difícil é.... é muita adrenalina e todos amamos adrenalina, porque nos faz sentir bem, mas temos de balançar”, frisa.
Em Portugal, depois de várias passagens, o impacto do público foi sentido pela dupla. “Portugal é incrível, está lá em cima, no meu top 3 de lugares no mundo para os Jungle, mesmo que não vamos tanto quanto eu gostaria. Nós fizemos Paredes de Coura, incrível, NOS Alive… Estamos ansiosos para o concerto nosso, Lisboa é uma cidade cheia de diversão, estamos muito ansiosos por voltar”, remata.
