<p>Inesperadamente, num domingo. Em acto de vagabundagem turística pela região de Suffolk, no sudeste de Inglaterra, a percepção visual de Ipswich provocou acelerada expansão do território das memórias. Pior ainda quando cada passo obriga a firmar os pés no presente enquanto se ajusta contas com o pretérito. Umas vezes mais perfeito do que outras...</p>
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Na verdade, o mais chocante foi contrapor o silêncio de uma cidade deserta, em 1996, com as recordações televisivas de um estádio inglês em elevado teor de ebulição, em Maio de 1981. Então, era a final da Taça UEFA que passava pelos olhos de um adolescente, fascinado por ver uma equipa - o Ipswich Town, guiado por Bobby Robson - subjugar milhares de adeptos e os holandeses AZ Alkmaar a uma só vontade, vencer. O que, de facto, aconteceu. Mesmo após perderem na Holanda passadas duas semanas (na altura, a atribuição do troféu era decidida em dois jogos).
Na Ipswich que se me apresentou, as calçadas não tinham quem as massacrasse. Vagueei, ainda mais surpreendido do que os meus companheiros de viagem. Eles não sabiam da euforia de 15 anos antes.
O desplante foi tal que até o referido estádio fez a perversa questão de aparecer. Mudo e quedo. Um pouco degradado, inclusive. "Anyway..."
No ocaso de uns largos minutos de viagem ao lado esquerdo do condutor, a vida saltou. De repente.
Um estabelecimento turco, decorado por um empregado de tédio abundante, prometia bebidas e comida. Coube à vertente sólida intrigar. "Kebab", exclamavam os gatafunhos.
O risco, o risco. "Sabes lá o que é kebab". Não sabia, mas queria. Libras na mão e o prato que o transportava aterrou. De lá, saiu uma espécie de sande de pedaços de carne servidos em pão pita com cebola crua, molho de chilli e salada.
Viria a saber que o kebab é originário da Turquia e comum na Grécia e restante costa mediterrânica. Não é bom, nem mau, antes pelo contrário.
Pelo menos, teve a nada menosprezável virtude de colorir uma cidade que se pintou de cinzento cor de traição para me receber.