Superou ataques cardíacos e cancros, mas não a covid-19. Desaparece aos 87 anos um dos maiores entrevistadores dos EUA de sempre
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"Nunca aprendi nada", Larry King gostava de repetir, "enquanto estava a falar. Por isso preferia ouvir". De aparência inconfundível, óculos desproporcionalmente grandes, suspensórios estirados, voz cava, tinha uma pose afável e tranquila que o distinguia dos entrevistadores de TV mais intensos, aperfeiçoando-a ao ponto da arte, numa abordagem casual e sempre inclinado para frente, a ouvir atentamente, raramente interrompendo. "Numa boa entrevista, já sabes mais do que precisas antes de começar. Mas talvez possas terminar com algumas das tuas opiniões alteradas, se realmente ouvires", disse King ao LA Times. "E deves certamente sair entretido - um entrevistador também é um artista".
O rei entrevistador morreu. "Com profunda tristeza, a Ora Media [império que fundou após reformar-se da CNN, em 2010] anuncia a morte de nosso co-fundador, anfitrião e amigo Larry King, que faleceu esta manhã [sábado] aos 87 anos no Cedars-Sinai Medical Center em LA", disse um comunicado no Facebook. "Durante 63 anos e em todas as plataformas de rádio, TV e media digital, os milhares de entrevistas, prémios e aclamação global de Larry são um testemunho do seu talento único e duradouro." A declaração não revelou a causa da morte, mas fonte familiar confirmou que King foi hospitalizado com covid após o Natal. Já superara um cancro no pulmão, vários ataques cardíacos, um bypass quíntuplo, anginas de peito e a terrível tragédia de ver dois filhos morrer em 2019: Andy King, 65 anos, de coração, e Chaia King, 52, de cancro pulmonar. King deixa três filhos, de sete casamentos (e seis divórcios).
Nascido Larry Zeiger, no Brooklyn, NY, foi criado como judeu ortodoxo, não acabou o liceu, não fez universidade, apaixonou-se pela rádio, que o exaltava, e mudou de nome em 1957, minutos antes de se estrear na rádio WMBM, de Miami. Zeiger é demasiado étnico, disse-lhe o patrão a folhear o jornal e a parar num anúncio de um "King of liquor" (rei do álcool") - e renascia Larry King.
A eterna imagem que temos dele foi forjada na CNN, TV onde entrou em 1985 para ficar no ar 25 anos; fez 6 mil vezes o "Larry King Live", visto por milhões, entrevistou hordas de celebridades, presidentes dos EUA - "como é ser baleado?", perguntou desarmadamente a Reagan; "se não tivesse perdoado Nixon, ganhava a reeleição?", perguntou a Gerald Ford -, líderes mundiais, artistas, atletas, socialites e criminosos convictos como OJ Simpson. Recebeu vários prémios Cable ACE, Peabody Awards e prémios de carreira. Recentemente, apresentava o "Larry King Now" e "Politicking with Larry King" na Hulu, Ora TV e RT America.
Não acreditava na vida pós-morte, disse ao NY Times. ""Não compreendo, num minuto estás aqui e a seguir já não"". E depois de dizer que a vida precisa de três coisas - "paixão, humor e um grão na asa" - descreveu o funeral ideal. "Gostava que a minha cerimónia começasse assim: "Hoje homenageamos um homem de 160 anos que foi apanhado na cama por um marido irado. E o funeral está atrasado porque ele demorou seis dias até conseguir tirar o sorriso da cara".