
Laurie Anderson: compositora norte-americana de 78 anos é a atração magnética de "X2"
Foto: João Octávio Peixoto/TMP
Compositora norte-americana revelou no Teatro Rivoli, no Porto, espetáculo de pop armadilhada de camadas invisíveis e profundas. Esta quinta-feira à noite, Laurie Anderson realiza a segunda e última récita de "X2".
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Em qualquer concerto, nunca está em palco só o artista que atua. Estão lá também as suas referências e influências mais ou menos veladas. Poucas vezes acontece é esse cosmos pessoal estar quase literalmente exposto diante da plateia - e o concerto ser não uma soma do artista e seus convidados, mas uma concentração cósmica de talentos que formaram e definiram aquele que atua. Foi o caso do espetáculo de Laurie Anderson, na quarta-feira à noite, no Teatro Rivoli, no Porto.
Mais próximo do concerto do que da performance, que deverá acontecer num espaço metonímico - em continuidade com o real - e não no espaço metafórico e delimitado do palco, "X2", que também não é um concerto convencional, revelou logo à cabeça a constelação de tutelas da mulher que compõe, escreve, dança, filma e faz música desde os anos 1970. Escorriam na tela gigantes: Bob Dylan, William S. Burroughs, John Cage, Allen Ginsberg ou Gertrude Stein.
E cada um deles participou no espetáculo - porque sem cada um deles não existiria Laurie Anderson. Fosse musicalmente, numa versão minimalista e rarefeita de "Hard rain", que de certo modo punha em diálogo Bob Dylan e John Cage, fosse numa evocação da linguagem como lugar de invenção (os textos-paisagem de Stein) ou como alerta para dinâmicas perversas da atualidade - lembrando a citação de Burroughs "a linguagem é um vírus", Anderson elencou uma série de palavras que estão a ser eliminadas de documentos oficiais nos EUA e declarou: "Se a palavra "equidade" desaparece, acabaremos por esquecer o seu significado e, no limite, o sentimento associado a esse significado."
Entre o comentário político, as histórias pessoais e a exortação à felicidade, a artista deu bom uso ao conselho de outro performer insigne, Joseph Beuys, que pedia para tornarmos os nossos segredos produtivos. Foi essa pop armadilhada, de camadas invisíveis e profundas, que dominou o espetáculo, cujo encore foi um momento partilhado de Tai Chi.
Esta quinta-feira à noite há nova récita de "X2" no Teatro Rivoli - os bilhetes estão, há muito, esgotados.
