Estreia esta quinta-feira nos cinemas um filme cujo título já é um programa: “Ler Lolita em Teerão”. Drama retrata as primeiras décadas da Revolução Islâmica que derrubou o xá e instaurou o atual regime dos aiatolas no Irão.
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A estreia neste momento de um filme financiado por organismos públicos israelitas, realizado por um israelita, interpretado por várias atrizes iranianas no exílio e cuja ação se passa nas primeiras décadas da Revolução Islâmica no Irão (movimento popular que derrubou a monarquia do Xá Reza Pahlavi e estabeleceu uma república teocrática liderada pelo aiatola Khomeini) poderia ser vista como uma manobra oportunista.
No entanto, a chegada às salas de “Ler Lolita em Teerão” estava anunciada muito antes da já chamada "Guerra dos 12 Dias" (o ataque de Israel e dos EUA ao Irão) e a história que nos relata já fora contada em livro, há mais de 20 anos. A edição portuguesa data desse período.
De qualquer forma, “Ler Lolita em Teerão” é uma peça importante para se perceber melhor o que se passa ainda hoje no Irão, através da história verídica de Azar Nafisi, que regressou à sua Teerão natal a seguir à Revolução Islâmica e começou a dar aulas de literatura na universidade.
Com o novo regime dos aiatolas a impedir a livre escolha dos livros que ensinava, decidiu criar um clube de leitura na sua casa, para um grupo restrito, mas fiel, de alunas. Voltando a escapar do país em 1997 e radicando-se nos Estados Unidos da América, publicou em 2003 a sua autobiografia, “Ler Lolita em Teerão”, escreveu outras obras e continuou o percurso académico.
A versão para cinema, realizada por Eran Riklis, representante de um cinema israelita de visão aberta sobre a paz na região, foi filmada em Itália e é interpretada, entre outras, por duas grandes atrizes iranianas hoje exiladas em Paris, Golshifteh Farahani e Zar Amir Ebrahimi
O filme divide-se em quatro períodos históricos, cada qual relacionado com um livro proibido: “O grande Gatsby”, “Lolita”, “Daisy Miller”, “Orgulho e preconceito”. Cruza o universo dos respetivos autores com a evolução da vivência social no Irão, fala das questões específicas do lugar da mulher e procura sempre o equilíbrio entre o íntimo e o político.
O drama recorda-nos ainda um princípio universal vital: o direito à liberdade e o papel da palavra como forma de resistência contra todos os totalitarismos.