No novo livro “Queria? Já não quer?”, autor Marco Neves desmistifica algumas das principais expressões do Português.
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Qual agente (pouco) secreto ao serviço da língua portuguesa, Marco Neves desenvolve há anos uma missão absolutamente louvável: disseminar a paixão incontida que nutre pelo idioma pátrio, transmitindo a quem o lê ou ouve os amplos recursos linguísticos ao dispor de qualquer falante.
Muito ativo nas redes sociais, o professor e investigador tem sido incansável no seu esforço de contribuir para um alargamento efetivo do saber em torno do Português. Fá-lo sem exibir um tom doutoral ou pretensioso, infelizmente dominante no meio, socorrendo-se de uma abordagem tão direta quanto rigorosa que se vale de um estratagema quase infalível – para chegar ao maior número possível de interessados, Marco Neves opta pela aproximação humana ao tema, certo como está de que tudo quanto tem rosto é mais suscetível de ser assimilado.
É o que acontece com o seu mais recente livro. Em “Queria? Já não quer?” (edição Guerra & Paz), o autor de “A incrível história secreta da língua portuguesa” e “Assim ou assado”, este em parceria com Sam The Kid, abraça o desafio particular de tirar a limpo alguns mitos ou ideias feitas que pululam acerca da língua. No seu propósito figuram sobretudo as teses de tal forma entranhadas que já as damos por adquiridas, sem sequer nos darmos ao trabalho de pesquisar sobre a sua (falta de) veracidade.
Inscreve-se nesta categoria, por exemplo, a suposta convicção de que o regime de Salazar inventou a palavra “encarnado” para que a cor do Benfica não fosse associada ao vermelho associado ao Partido Comunista. Ora, basta ler o célebre poema de Camões “Descalça vai para a fronte” para constatarmos que o “encarnado” já era mencionado pelo menos desde o século XVI.
Na graça que dá título ao livro, particularmente popular entre os profissionais da restauração, o também tradutor e revisor demonstra que, afinal, a referida expressão é uma das várias formas possíveis de fazer um pedido, o que será bastante útil da próxima vez que alguém nos quiser corrigir pelo suposto erro.
Neste autêntico polígrafo linguístico, Marco Neves aproveita ainda para desmistificar a falsa certeza que assegura(va) que o bem conhecido “obrigado” é uma derivação direta do japonês “arigato”, ou que o mais famoso palavrão da nossa língua (não confundir com “baralho”) designava “a pequena cesta que se encontrava no alto dos mastros das caravelas”. Na realidade, as origens do referido insulto são anteriores à própria fundação do reino, tendo o seu uso chegado incólume até aos nossos dias.
De leitura fácil e desenfadadiça, o volume convida-nos a olhar para a língua com o encanto das primeiras coisas. E libertos de mitos infundados, já agora.